Docente discorrerá sobre o assunto nesta sexta-feira (12). Evento é uma realização do CCON em parceria com a ASMEGO
O doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) professor Lair da Silva Loureiro Filho ministra, nesta sexta-feira (12), em Goiânia, a palestra Justiça e Intolerância Social, dentro do projeto Café de Ideias, uma realização do Centro Cultural Oscar Niemeyer (CCON) em parceria, nesta edição, com a Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (ASMEGO). O caráter jurídico dessa discussão, assim como o nome do palestrante são indicações da ASMEGO em contribuição com o projeto desenvolvido pelo CCON.
Lair Loureiro, que é especialista em Direito Constitucional pela Samford University, fala com exclusividade à equipe de Comunicação da ASMEGO sobre práticas de justiçamento e racismo, que nortearão o debate de sexta-feira, voltado a profissionais das áreas jurídica, social e filosófica, além de estudantes e público em geral. A programação tem início às 19h30, no CCON, com entrada franca.
Quais questões o senhor abordará na palestra Justiça e Intolerância Social?
Iniciarei com um breve histórico das diversas manifestações de intolerância, procurando demonstrar que o tema é tão antigo quanto a humanidade, agravado especialmente por variáveis econômicas – e também religiosas, étnicas. A Justiça deve desempenhar sua função primordial de manutenção da paz social, o que tem sido dificultado pelo descompasso existente entre um arcabouço legal, concebido em meados do século XX, e a repentina transformação da sociedade brasileira, bem como pela omissão do Estado em propiciar condições materiais para que se implante, efetivamente, o Estado Democrático de Direito a que alude a Carta de 1988.
Em sua análise, o que explica a onda de casos de justiçamento ocorrida nos últimos dois anos no Brasil?
A percepção de falência dos instrumentos institucionais, especialmente do aparelho jurídico-policial.
Tendo em vista a segurança pública, de competência do Poder Executivo, quais medidas devem ser tomadas pelos governantes para fazer valer um policiamento efetivo, que iniba também violências dessa natureza?
Linchamento não é justiça, é crime. Deve ser combatido da mesma forma que qualquer delito. Um policiamento ostensivo a cargo da Polícia Militar, uma atividade investigatória eficiente da polícia judiciária - Polícia Civil -, e um sistema de execução penal que cumpra minimamente seu objetivo, seria o quadro desejado.
E como o Poder Judiciário pode contribuir no combate a ações de linchamento?
Processando e julgando os responsáveis, salientando, uma vez mais, que linchamento não é justiça, é crime.
O retrato-falado de uma mulher suspeita de sacrificar crianças em rituais de magia negra, que circulou na internet em maio passado, resultou no linchamento por engano da dona de casa Fabiane Maria de Jesus, em Guarujá (SP). De que forma o Estado deve agir frente a pessoas que incentivam e praticam justiçamento?
Essas pessoas devem ser responsabilizadas criminalmente, na medida de sua participação comprovada. A humanidade percorreu séculos para delegar ao Estado o monopólio do uso da força. As instituições devem ser reformadas e não desconsideradas, caso contrário chegaremos à barbárie em pouco tempo, à "luta de todos contra todos", de Hobbes.
Qual a sua avaliação sobre a prática de racismo, sobretudo étnico, que se intensificou nos últimos meses, no Brasil e na Europa, contra jogadores de futebol de cor negra?
Toda forma de discriminação, seja racial, religiosa ou de qualquer outro verniz é burra, irracional e perigosa. O fenômeno na Europa, apesar de lamentável, pode até ser explicado pelo infeliz histórico do continente, agravado pela sua decadência econômica e política. No Brasil, é inadmissível, pois somos todos filhos de uma fantástica miscigenação.
Na sua opinião, o que pode ser feito pelos Poderes constituídos para banir atitudes racistas não apenas no meio esportivo, mas em toda a sociedade?
A aplicação da legislação existente, acrescentando à sanção reclusiva o aspecto pecuniário extremamente gravoso.
O senhor acredita que a sensação de impunidade que se desdobra no Brasil pode levar, a longo prazo, a um colapso em nosso sistema jurídico?
Sim, acredito, e, infelizmente, a médio prazo e não apenas do sistema jurídico, mas do Estado brasileiro como conhecemos hoje, seja como Estado de Direito ou até mesmo a própria integridade territorial conquistada ao longo de sua história. A equação força mais consenso, que estabelece a norma fundamental de qualquer ordenamento jurídico, está se rompendo e pode resultar em um novo poder constituinte originário. Nada garante que dará origem a uma ordem democrática, ao contrário.
O que o Poder Judiciário pode fazer para tornar efetivo o combate à intolerância social?
Fazer o seu papel, que tem procurado fazer apesar da sobrecarga de trabalho e penúria de recursos. O Poder Judiciário não pode ficar a reboque de um orçamento mutilado pelo Poder Executivo, que não vê qualquer vantagem em um Judiciário forte, ao contrário, pretende torná-lo mero departamento jurídico. Não há independência se não houver autonomia financeira efetiva. Em suma, o Poder Judiciário precisa ter independência financeira real; informatização efetiva do processo em todas as suas fases e instâncias; alteração da legislação processual; democratização da gestão dos Tribunais com a participação dos magistrados de primeiro grau; e devolução de atividades estranhas à sua missão: execuções fiscais, execução penal, atividade registrária e notarial. A redução do acervo processual a patamares aceitáveis reduziria o tempo de duração do processo - garantia Constitucional -, passando à sociedade a percepção de uma prestação jurisdicional eficiente. Justiça morosa é justiça ineficaz, permite a proliferação de formas paralelas de realização privada da justiça.
Fonte: Assessoria de Comunicação da ASMEGO