O jornal O Popular de hoje (13) traz reportagem sobre o aumento da aplicação de penas alternativas em Goiás. Entrevistados pelo veículo, os juízes Telma Aparecida Alves e José Carlos Duarte atestam os benefícios da medida para o sistema prisional, para a Justiça e para a sociedade. Leia a íntegra da reportagem:
Justiça
Punição sem necessidade de cela
Cresce número de sentenças aplicadas em Goiás com penas alternativas. Para juízes, medida possibilita ganhos para a sociedade e para o próprio condenado
Criadas há mais de duas décadas com o objetivo de desafogar as prisões e reduzir as taxas de reincidência criminal, as penas alternativas, como prestação de serviços à comunidade e pagamento de multas, estão sendo cada vez mais aplicadas em Goiás. Com elas, a Justiça evita mandar para a cadeia os réus primários condenados por pequenos delitos e crimes menos graves, praticados sem violência e que teriam penas de, no máximo, até quatro anos de detenção, como furto, rixas, delitos de trânsito e lesões corporais leves.
Informações do Setor Interdisciplinar Penal (SIP) ligado à Vara de Execuções Penais mostra que, em 2010, 1.024 pessoas foram submetidas a esse tipo de pena em Goiânia e em Aparecida de Goiânia. Em 2011, esse número subiu para 1.256. Este ano, contabilizados os dados até a última quinta-feira, já são 847 pessoas cumprindo penas alternativas nos dois municípios. Atualmente, 90% dos condenados são homens, contra 10% de mulheres.
Conforme a juíza da Vara de Execuções Penais, Telma Aparecida Alves, as penas alternativas, que surgiram a partir da reforma da parte geral do Código Penal, ocorrida em 1984, se apresentam mesmo com clara intenção de funcionarem como substitutivos penais para as penas privativas de liberdade. “Quando se fala em penas alternativas, nós não estamos falando de impunidade. Estamos tratando apenas de uma forma diferente de se cumprir a pena”, afirma.
Segundo a magistrada, ao evitar levar a pessoa para a prisão, onde deverá ficar sob a tutela do Estado, ganha o poder público, porque não tem despesa com o preso, e ganha a sociedade, pois o indivíduo que foi condenado vai prestar serviço à própria sociedade. Em alguns casos, além do trabalho, a pessoa tem ainda de pagar multa em dinheiro. Nesse caso, os valores são revertidos em favor da própria vítima ou mesmo de entidades filantrópicas ou organizações não-governamentais.
O advogado criminalista Arthur (nome fictício, pois preferiu não se identificar) está entre os goianos que prestam serviço à comunidade. Ele foi forçado a trabalhar por ordem da Justiça após ter sido condenado a dois anos de prisão por porte ilegal de arma, em 2005. “Quem deve tem de pagar”, diz Arthur, que desde setembro do ano passado trabalha sete horas por semana no próprio SIP. O prazo para cumprimento da pena dele termina no mês que vem.
A experiência profissional permite que Arthur hoje tire dúvidas de outros condenados que comparecerem mensalmente à unidade. “A possibilidade de cumprir a pena fora da cadeia é altamente favorável ao réu”, pondera o advogado, que considera a alternativa penal muito eficiente. “Ela cumpre seu papel de ressocializar o condenado”, diz. A mesma opinião tem o juiz da 7ª Vara Criminal de Goiânia, José Carlos Duarte, que costuma optar pelas penas alternativas sempre que possível.
Segundo José Carlos, as penas alternativas são medida punitiva de caráter educativo e socialmente útil. Elas propõem o não afastamento do indivíduo da sociedade, não o excluindo do convívio com seus familiares e principalmente não o expondo aos males do sistema penitenciário. “O indivíduo não perde o vínculo familiar, pode continuar exercendo sua profissão ou seu trabalho normalmente sem qualquer prejuízo, pois seu horário de trabalho é respeitado, já que a prestação de serviço será cumprida conforme sua disponibilidade de dias e horários”, explica.
Baixa reincidência
Outro ponto favorável às penas alternativas é que a taxa de reincidência entre os condenados é pequena. No caso dos presos reclusos nos presídios, o índice de reincidência, segundo informações do Ministério da Justiça, chega a 85%. Já entre aqueles que cumprem penas alternativas, esta porcentagem é de no máximo 5%, em média.
318 entidades atuam com condenados
Em Goiânia e Aparecida de Goiânia existem hoje 318 entidades que recebem trabalhadores enviados pela Justiça. A maioria delas são entidades que atuam nas áreas de saúde e educação. Também aceitam pessoas que cumprem penas alternativas igrejas católicas e evangélicas. “Organizações não-governamentais estão ainda entre as cadastradas”, avisa a coordenadora do Setor Interdisciplinar Penal (SIP) da Vara de Execuções Penais, Zenaide Gonzaga de Castro.
Segundo ela, cada uma das entidades tem a obrigação de fornecer ao condenado atestado de frequência ao serviço, que deve ser entregue mensalmente, entre os dias 1º e 10, no SIP. “Se não apresentar o documento, o processo do condenado é enviado ao juiz da Vara de Execuções Penais, que manda intimá-lo para uma audiência de justificação. “Para maior controle, o SIP faz, sempre depois do dia 10 de cada mês, uma varredura no seu sistema para que ninguém fique inadimplente”, afirma Zenaide, que garante que o controle de frequência é muito rigoroso.
“Caso não haja uma justificativa plausível para o não comparecimento ao trabalho, o juiz pode até optar por transformar a pena em prisão”, explica Telma Aparecida. Já se o condenado comprovar que, devido ao trabalho cotidiano não tem como comparecer à prestação de serviço comunitário, o juiz pode manejá-lo ou mesmo optar por transformar a pena em pagamento de multa.
Além disso, para que a pessoa seja encaminhada ao trabalho ideal, que ajude na sua ressocialização, ela passa, primeiramente, no SIP, por uma avaliação. Quem foi condenado por dirigir bêbado, por exemplo, pode receber assistência de um psicólogo e de um assistente social e ser encaminhado a um grupo de Alcoólicos Anônimos e ainda ter de frequentar hospitais para se conscientizar das consequências que os acidentes causam às suas vítimas.