A intensa e incessante luta da AMB e a política de diálogo junto aos Três Poderes, em defesa dos interesses da Magistratura, ainda não garantiram a recomposição dos subsídios, mas deram grandes passos na interlocução com os Parlamentares. Tanto é que, no próximo dia 23, será lançada a Frente Parlamentar em defesa da Magistratura e do Judiciário, com o objetivo de criar uma trincheira em defesa de melhores condições de trabalho e de segurança para a classe.
“Não é fácil; se fosse, não estaríamos há seis anos sem reajuste”, apontou Calandra, apostando, cada vez mais, no caminho do diálogo e da interlocução como ferramentas de conquistas. “Retomamos o diálogo que estava rompido; isso foi uma das maiores conquistas deste primeiro ano de mandato. Nessa caminhada, é fundamental mantermos a mobilização”, disse Calandra, fazendo apelos para que as lideranças da Magistratura, e cada Magistrado, mantenham a defesa, junto à Bancada de Parlamentares de seus Estados, dos projetos de interesse da Magistratura.
“Já conquistamos a formação da Frente Parlamentar que terá um grande impacto no desenvolvimento dos trabalhos do Poder Judiciário daqui para frente. A Magistratura vai restabelecendo um canal que estava rompido aqui com o Poder Legislativo. Nós já fizemos o ato público nacional, no mês de setembro, onde nós mostramos nossa preocupação com temas institucionais, quando reunimos quase dois mil Juízes, em Brasília, por meio de uma inédita mobilização e união das associações filiadas”, apontou o Presidente da AMB, destacando o ineditismo do movimento.
“Em 61 anos de história da AMB, nunca existiu uma mobilização como essa. Foi um movimento vitorioso. Eu ouvi do presidente do Senado, José Sarney, [no dia 21 de setembro, durante a entrega do manifesto de valorização da Magistratura e do MP]: “O Calandra está presente aqui [no Senado] desde o dia seguinte de sua posse como Presidente da AMB. Ele sempre vem trazer reivindicações da Magistratura. Eu posso dizer que o pleito de vocês é justo e conta com o meu apoio”, contou Calandra, ao confirmar que as negociações visam a construir também uma política de dignidade para os subsídios. “Que não seja apenas para resolver o problema daquilo que nós já perdemos”.
Após intensas conversas e encontros com Parlamentares, Calandra está convencido de que o Poder Executivo está mal informado sobre o reajuste dos subsídios. “Há uma coisa que nós temos que esclarecer, tanto para nós mesmos como externamente: o nosso pedido salarial não está vinculado ao pedido salarial dos servidores. Os servidores querem um aumento de mais de 50%. Nós estamos pedindo 5,25% para este ano e 9% para o ano que vem. Trata-se de uma reposição pela inflação, isso é bem diferente de aumento salarial. O nosso valor está no Orçamento da União, há rubrica, há verba, há reserva, se esse dinheiro não for gasto vai voltar para os cofres da União, ou seja, será subtraído de nós Magistrados”.
Ele ainda considerou uma grande mentira a história de que a reposição salarial causará um impacto de R$ 8 bilhões aos cofres públicos. “Isso é uma falácia. O aumento pleno é de R$ 170 milhões, na primeira fase, e de R$ 403 milhões, na segunda etapa. Eu não acho que seja má-fé a veiculação desses números equivocados, acredito que seja uma visão errônea de pegar o Judiciário como um todo e de não olhar apenas o Poder Judiciário, que é protagonizado pelos Juízes, de modo diferenciado. O que nós estamos pedindo é a preservação de uma garantia de um Poder de Estado. Estamos pedindo que não seja reduzido o salário do Juiz”, reafirmou.
O Presidente da AMB ainda manifestou preocupação, perante os Parlamentares, com as condições de trabalho e segurança dos fóruns e dos Magistrados. “Temos condições extremamente precárias de trabalho; há fóruns nos quais não existe um mínimo de segurança. Essas são algumas das prerrogativas. Há também a prerrogativa de independência de julgar, mas o que está acontecendo agora? Um desvio absoluto da função do CNJ. Advogados mal intencionados vão ao CNJ reclamar do juiz, acusando-o de diversas coisas para afastá-lo do processo, e depois, antes que saia uma sentença desfavorável, eles ingressam com uma rescisória com base no processo que eles mesmos produziram no CNJ”, advertiu Calandra, apontando que outras prerrogativas também são violadas pelos Tribunais que dizem para o Juiz fazer audiências em horários determinados, ditando o conteúdo e, muitas vezes, censurando o juiz.
“A independência da Magistratura é o maior tesouro de um povo, ainda que o Juiz erre, ainda que haja qualquer problema”, defendeu ele, lembrando-se de quando foi dirigente da União Internacional de Magistrados (UIM).
“Qual o tesouro que nós buscávamos? Juízes independentes. Não queríamos mais nada além disso. Nós sabemos, porque convivemos com regimes totalitários em todo o mundo, que a independência do Juiz é a ferramenta essencial para uma vida democrática plena. Juiz subjugado, Juiz amedrontado, Juiz estressado. O nível de estresse e o nível de cobrança são muito alto. Em pleno século XXI, com grandes desafios, nós estamos usando ferramentas legais e processuais do século XX. Essa é a nossa vida, uma vida de um trabalho imenso, muitas vezes não reconhecido”.
Ao invocar a unidade e mobilização de todos os Magistrados, o Presidente da AMB citou o exemplo de Adauto Lúcio Cardoso, Ministro do STF, que um dia arrancou a toga e a jogou em cima da mesa dizendo que não queria mais ser Juiz enquanto existissem Juízes que não fossem independentes.
“Também me lembro do exemplo de dignidade e austeridade do Victor Nunes Leal, cassado pela revolução, acolhido pelo meu amigo Pedro Gordilho [advogado em Brasília]. Tiraram o cargo dele de ministro do STF, mas, no dia seguinte, às 8 horas da manhã, ele foi ao encontro do Pedro Gordilho e disse: “Estou aqui para trabalhar, tiraram-me o cargo de Ministro, mas não me tiraram o sonho de liberdade, de democracia e de justiça”. A vida dele é um exemplo de dignidade, de austeridade e de ética”.