Foram quatro dias de argumentos, opiniões, palestras e dados científicos. De um lado, defensores do direito das mulheres de decidir sobre prosseguir ou não com a gravidez de bebês anencéfalos. Do outro, aqueles que acreditam ser a vida intocável, mesmo no caso de feto sem cérebro.
Na audiência pública proposta pelo relator da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 54, ministro Marco Aurélio, foram ouvidos representantes de 25 diferentes instituições, ministros de Estado e cientistas, entre outros.
Eles expuseram suas posições na tentativa de trazer clareza ao tema, que será votado pelos onze ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Esta foi a terceira audiência pública promovida na história da Corte. As duas anteriores foram sobre pesquisa em células-tronco embrionárias e sobre importação de pneus usados.
Considerações Finais
O advogado Luis Roberto Barroso, que propôs a ADPF 54 em nome da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde, disse que foram quatro sessões longas e extremamente proveitosas e agradeceu às diferentes entidades religiosas, científicas, médicas e da sociedade civil que participaram do debate. Em nome da Confederação, Barroso destacou o privilégio de ter compartilhado essas sessões com “pessoas de grande qualificação técnica e moral”.
Ao final, ele fez suas considerações sobre o debate realizado e destacou que o diagnóstico é feito com 100% de certeza e é irreversível, além de dizer que a rede pública de saúde tem plenas condições de fazer o diagnóstico assim como realizar o procedimento médico adequado. Disse ainda que a anencefalia é letal em 100% dos casos, sendo que 50% morrem durante a gravidez.
Em sua opinião, prosseguir com a gravidez traz risco para a saúde da mulher e lembrou que não é possível transplantar órgãos de anencéfalos, além de afirmar que a interrupção deve ser tratada como antecipação terapêutica do parto e não aborto. Por fim, disse que a anencefalia não se confunde com deficiência, pois não há crianças ou adultos com anencefalia.
Ministério Público
O representante do Ministério Público, o subprocurador-geral da República Mário Gisi, destacou que depois da criação da TV Justiça a realização de audiências públicas foi o segundo grande passo dado pelo Supremo Tribunal Federal para aproximar o Judiciário da sociedade.
Para ele, essas quatro sessões demonstraram o quão necessário é ouvir diversos segmentos, e a Corte, por mais sábia que seja, não teria condições de coletar tantos dados e tantas diferentes posições trazidas pelos especialistas.
Ministro Marco Aurélio
Ao encerrar o debate, o relator da ação, ministro Marco Aurélio registrou que a audiência pública foi “norteada pela espontaneidade e pela liberdade em seu sentido maior”. Avisou que tudo o que foi falado durante os debates será integrado ao processo com DVDs que serão encaminhados aos ministros do Supremo.
Ele agradeceu a todos os participantes da audiência e disse que com os elementos apresentados irá confeccionar o relatório e voto e pedir dia para julgamento da ação. “Sem elementos não há julgamento, não se julga”, afirmou.
Após o término da audiência pública, o ministro concedeu entrevista a jornalistas e confirmou a previsão de julgamento estimada para o mês de novembro deste ano, mas advertiu: “há quem diga que eu sou otimista em excesso quanto à agilização da máquina judiciária”. Ele disse que o processo esteve parado por quatro anos com a finalidade de aguardar um momento propício para a realização da audiência pública.
Marco Aurélio fez um balanço da audiência ao declarar que esta foi a que contou com a apresentação de mais esclarecimentos, o que vai permitir que a Corte conclua o processo com mais segurança e que atenda aos interesses da sociedade em geral. E quanto à previsão da decisão, o ministro assegurou que o STF visará a preservação da saúde física e psíquica da mulher.