Associação dos Magistrados do Estado de Goiás

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CNJ não fará exame de conteúdo das decisões de juiz

A crise entre o STF e a Justiça Federal de São Paulo teve desdobramentos numa agitada segunda-feira, em razão de ter sido programado uma manifestação pública em apoio ao juiz federal Fausto Martin De Sanctis. Um grupo de advogados também promoveu um encontro de "desagrtavo" em São Paulo, manifestando apoio ao presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes. O grupo entregou ao ministro um "manifesto de solidariedade de advogados por sua posição em defesa do Estado de Direito".



No mesmo dia 14, o STF divulgou notícia que foi interpretada como um recuo de Gilmar Mendes. Ele disse ao presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Fernando Mattos, que o envio de peças processuais a órgãos administrativos da Justiça, como o CNJ e o CJF, tem a única intenção de “complementar estudos destinados à regulamentação de medidas constritivas de liberdade”.



De acordo com a assessoria de imprensa do STF, as peças processuais em questão são do Habeas Corpus (HC) 95009, por meio do qual Gilmar Mendes concedeu liberdade a investigados pela Polícia Federal na Operação Satiagraha. Documentos do processo foram encaminhados ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ao Conselho da Justiça Federal (CJF) por decisão de Gilmar Mendes, assim como ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região.



A afirmação do presidente do STF foi feita em documento enviado no dia 14 ao presidente da Ajufe, em resposta a ofício encaminhado por Mattos, via e-mail, no último dia 12 (elia abaixo). No ofício, o presidente da Ajufe solicita que o presidente do STF esclareça que “não houve representação ou determinação para abertura de procedimento administrativo em relação ao juiz federal Fausto Martin De Sanctis”.



Em sua resposta à Ajufe, Gilmar Mendes frisou que “em momento algum houve determinação de que se procedesse a qualquer averiguação de conteúdo, quer sob o ponto de vista técnico ou ideológico, de provimento judicial”.



Ele reafirma que a medida visa a “defender as garantias democráticas constitucionais, sobretudo num período em que se observa total descontrole de ações constritivas de liberdade, a exemplo das interceptações telefônicas e quebra de sigilos fiscal, bancário e de correspondência, já constatado oficialmente”.



Juiz natural



Juristas de todo o País continuam discutindo aspectos técnico-processuais da decisão do ministro Gilmar Mendes que resultou na libertação do banqueiro Daniel Dantas. Membros do Ministério Público Federal alertaram que o STF e o STJ têm centenas de decisões rejeitando a já popular "supressão de instância". As decisões citadas rejeitaram recursos interpostos diretamente a um tribunal superior sem que a questão tenha sido previamente discutida por uma instância inferior.



O que os procuradores questionam é o fato de o habeas corpus em que Mendes proferiu a decisão não ter sido interposto em razão da decisão proferida pelo juiz federal Fausto Martin de Sanctis. Uma reportagem do mês de abril, publicada pela Folha de S. Paulo , informou que Daniel Dantas estava sendo investigado pela PF "em razão de fortes indícios de crimes financeiros". Com fundamento nos fatos descritos na reportagem, os advogados do banqueiro "impetraram sucessivos Habeas Corpus para conseguir um "salvo-conduto" ao poderoso cliente", afirmaram os procuradores Ana Lúcia Amaral e Sérgio Gardenghi Suiama, do Ministério Público Federal, em artigo publicado no dia 15 de julho na Folha de S. Paulo.



"Nenhuma das ações chegou a ser definitivamente julgada; o mero indeferimento liminar do pedido em uma era causa para a impetração de outro Habeas Corpus em tribunal mais elevado. O STJ, por duas vezes, indeferiu o pedido de liminar formulado pelos advogados. Novo pedido estava pendente no STF quando sobreveio a prisão temporária de Dantas", argumentam os procuradores.



Desta forma, prosseguem, "o decreto expedido pelo juiz de primeira instância faz referência a fatos que nunca foram debatidos nos três Habeas Corpus anteriores". Neste ponto é que reside a maior insatisfação dos que condenam a "supressão de instância". "Jamais poderia o presidente do STF avaliá-los em uma liminar concedida durante o recesso forense, nem muito menos "pular" a competência do Tribunal Regional Federal e do STJ para decidir sobre a prisão decretada por um juiz de primeira instância", alegam.



Liberdades e garantias



Em entrevista veiculada pelo Jornal da Globo, o ministro Gilmar Mendes disse que o Supremo não faz distinção entre ricos e pobres. A seu ver, se os pobres não têm melhor assistência judiciária a culpa é do Executivo. “A questão das defensorias públicas é um problema que o Estado tem de resolver. Dever de instituir defensorias públicas próprias é do Poder Executivo, não é do Poder Judiciário”, observou.



Mendes também contestou as afirmações de que teria suprimido instâncias Habeas Corpus. “Muitas vezes o tribunal tem recebido Habeas Corpus até em papel de pão. O caso da progressão de regime (para condenados por crimes hediondos), por exemplo, recentemente decidida, foi decidida num caso de Habeas Corpus provocado pelo próprio preso. Portanto, é preciso encerrar com esse debate de que o Tribunal celebra uma justiça de classes”.



O ministro rebateu também a informação constante do relatório da Polícia Federal nas investigações sobre Daniel Dantas de que “os advogados do banqueiro se mostravam preocupados só com a decisão da primeira instância, já que teriam facilidades nas instâncias superiores”. O ministro foi enfático em sua resposta: “Esse é um tipo de vazamento malicioso. Quem acompanha a Justiça em primeiro grau, em segundo grau, ou no Supremo Tribunal Federal, sabe que a Justiça procura atuar com imparcialidade. Eu tenho a impressão que esse tipo de vazamento tem segundas e terceiras intenções”.



Espetáculos e Linchamentos



Outra discussão que veio à tona noavemente é a forma espetacular como são feitas as prisões pela Polícia Federal. A exibição da prisão do ex-prefeito Celso Pitta, filmado de algemas, além das cenas com policiais invadindo casas e residências, foi novamente criticada por advogados. Tem sido uma reclamação cada vez mais comum o caráter "sigiloso" dos inquéritos da Polícia Federal, contrariando a Constituição e o Estatuto da Advocacia.



Muitos advogados reclamam também que não têm acesso à totalidade das provas no momento da prisão. E em poucos dias as "provas" (gravações e vídeos) são vazadas para a imprensa, impedindo a defesa de qualquer ação.



Na prisão de Daniel Dantas, novamente a Rede Globo ficou com as melhores imagens. Ao longo da semana, a emissora tem exibido cenas "novas" das investigações, expondo os acusados e mesmo pessoas que eventualmente tiveram contato com eles.