Associação dos Magistrados do Estado de Goiás

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Em entrevista, Presidente do TJGO faz balanço do primeiro ano de sua gestão

Ao concluir o primeiro ano do mandato como presidente do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO), o desembargador Paulo Teles acredita que o judiciário goiano conseguiu se aproximar da população, um dos principais objetivos de sua gestão. Em entrevista à Tribuna, Teles afirma que alguns juízes já assumem o discurso de que são servidores do povo. Além da integração com a sociedade, ele cita também que a entidade conseguiu agilizar os processos que se acumulavam e traçar a construção de 46 obras pelo interior do Estado. “Foi extremamente positivo esse primeiro ano de gestão, porque nós alcançamos as metas principais”, comemora. Em conversa com os editores Anapaula Hoekveld, Elizeth Araújo e Marco Aurélio Vigário e a repórter Lourdes Souza, o presidente do TJ-GO se mostrou preocupado com a precarização do presídio Odenir Guimarães, antigo Cepaigo, e disse que é dever do Judiciário cobrar para que seja resguardada a saúde e a segurança do preso. 



Tribuna – Quando assumiu a presidência do Judiciário, o sr. afirmou que uma de suas metas era promover a aproximação com a população. Depois de um ano, isso já foi possível? 

Paulo Teles – Sim, conseguimos. Alguns juízes já assumem essa teoria e o discurso de que são servidores do povo. 



Em sua última visita à Tribuna, o sr. comentou sobre o fato de alguns juízes que não querem trabalhar em determinados localidades. Isso foi resolvido?

Esse ainda é um problema que persiste. O fato é que há juízes que insistem em não residir na comarca. O problema é que, com isso, eles acabam distante da realidade da comunidade local. Com isso, não conhecem as tradições da cidade, os costumes da população. E, muitas vezes, algumas decisões acabam  ferindo toda essa gama de cultura do povo. Por exemplo, limitar festas agropecuárias ou juninas para que terminem à meia noite durante os dias da semana e uma hora da manhã, nos finais de semana. Isso agride a população em sua cultura, até porque são festas realizadas de ano em ano e três, quatro vezes numa semana. Tomamos como exemplo o município de Rio Verde, que tem um parque agropecuário muito bem estruturado no centro da cidade, onde eram prestados aulas gratuitas para portadores da síndrome de down. E que agora será transferido para periferia da cidade. Veja bem um parque tradicional que, se incomodo alguém, o faz durante uma semana a cada ano! Uma decisão do Judiciário que vai redundar em prejuízo a comunidade de uma forma geral. 



Num caso como esse, onde está exatamente o problema? Nos juízes?

Isso não vem a ser um desvio de conduta funcional. Trata-se de uma decisão tomada, de acordo com a convicção que o juiz tem sobre o tema. Uma visão de cidadão e indivíduo, que destoa do comum da cidade. É sobre isso tipo de coisa sobre a qual discordo, porque acredito que se houvesse uma maior integração, obviamente, não haveria esse descompasso. Isso tudo depende da consciência, experiência, da compreensão, da acessibilidade e sensibilidade do juiz, que não pode ser somente um homem de gabinete, tem que ser um homem que circula no meio da população. Por isso costumo dizer que juiz tem de ir ao estádio de futebol, ao supermercado. Está presente onde o povo está. 



Qual o balanço que o sr. faze desse seu primeiro ano de mandato? 

Foi um ano extremamente positivo. Alcançamos as metas principais: a integração do Judiciário com a sociedade; o cumprimento da Meta 2 - a atualização dos processos protocolizados até dezembro de 2005; alcançamos as metas traçadas pelo CNJ [Conselho Nacional de Justiça]; levamos 46 obras ao interior do Estado. Também conseguimos aumentar o número de funcionários. Nomeamos mais de 300 funcionário, além de aprovarmos o plano de cargos e salários, que estava desatualizado há 15 anos. Criamos a universidade corporativa, que é a universidade do Judiciário, que vai preparar os funcionários e otimizar o trabalho. Caminhamos ainda para a instalar oito comarcas e 30 varas.



Sobre a mão de obra, o que tem sido feito para otimizar o serviço prestado?

Com a implantação do Projudi, ou seja, a virtualização dos processos, nós vamos chegar a um ponto em que teremos que trabalhar apenas com mão de obra altamente qualificada. Esse será o papel da  universidade corporativa, ou seja, preparar os nossos funcionários para uma nova realidade do Judiciário. 



Esssa novas contratações resolveram o déficit  funcional do TJ goiano?

Hoje, temos um déficit de dois mil funcionários. Mas acontece que, quando o Projudi estiver totalmente implantado, esses dois mil já não farão mais falta. Essa é uma outra vantagem da informatização do sistema.



Como tem sido a relação do Judiciários com o poder Executivo goiano?

O relacionamento com o governo estadual se dá de forma ampla, visível e integrada. É uma relação der parceria. Tenho um bom relacionamento com o governador Alcides. O mesmo ocorre com o Legislativo. Tenho uma boa relação com o presidente da Assembleia, bem com a Câmara Municipal de Goiânia de uma forma geral. Tenho feito essa pregação, de que não concebo um Judiciário afastado do meio político. Mesmos porque o político, queiramos ou não, é o agente transformador dos hábitos e costumes da sociedade. O político é o criador do bem e do mal da sociedade, porque são eles que nos fornecem as leis, são eles que legislam. 



O atual governo atendeu as demandas do Tribunal ou ficaram algumas pendências que precisam ser atendidas?

 Não, não ficou nenhuma. O governador tem tido uma boa vontade fora do comum, assim como os deputados. É bom que se diga no que o governador pode atender ao Judiciário, atendeu sem nenhuma restrição. Como é sabido, o Judiciário trabalha com dinheiro do fundo de recuperação, mas que, mesmo assim, depende da autorização do governador. E ele o tem feito, sem qualquer restrição. Por exemplo, vou investir R$ 180 milhões em obras e não tenho nenhum receio de fazer a concorrência destas obras, pois sei que, até iniciar a construção, o governador liberará o dinheiro na hora certa. 



Como o sr. avalia o relacionamento do presidente Lula com os poderes Legislativo e Judiciário?

A seu modo, vejo como natural. O presidente Lula, queiramos ou não, inaugurou uma nova fase na política brasileira. A fase do confronto verbal e desaforo, também. Mas tem se revelado um homem  altamente hábil na condução dos problemas que vão surgindo. Ao conseguir frear os malefícios do mensalão e fazer com que isso não resultasse em nenhum prejuízo para o Executivo, se mostrou um homem de habilidade e sensibilidade foras do comum. Mas ele se relaciona bem com o Poder Judiciário e com o Congresso Nacional, sim, embora já tenha chamado todos os deputados de picaretas. 



Dessas que foram ou estão sendo levantadas, qual o sr. considera que fará maior diferença na vida da população?

O Fórum Criminal, que foi iniciado ainda na gestão do desembargador José Lenar [de Melo Bandeira]. E faço questão de que isso fique bem claro! Penso que será uma obra que fará grande diferença para a Capital. Principalmente porque vai melhorar a prestação de serviço na área de criminal e de família. Trata-se de um prédio de ponta. Agora, onde quer que eu construa, seja um prédio de três andares, seja um prédio compacto, para aquele local, aquela comunidade, tenho certeza de que ele faz toda a diferença. Porque isso significa que a população receberá um melhor serviço do Judiciário, à medida que o juiz tem um lugar digno para desempenhar suas funções, bem como os demais funcionários, que têm a sua autoestima aumentada. Digo isso porque é o que percebo a cada lançamento de pedra fundamental ou entrega de um novo prédio. E através de um serviço bem prestado que conquistamos a credibilidade da população a que servimos. 



‘Os juízes goianos são os mais preparados do País’



Na semana passada, o CNJ divulgou uma nota dizendo que aguardava explicações do TJ em relação ao prédio onde está instalada as varas da Fazenda Pública, na Avenida 85. Essa questão não estava resolvida? 

A questão ali é simples. A gente saiu de um prédio e foi para outro. E o juiz entendeu que aquilo era um desrespeito à pessoa dele. O problema foi que, para ele, aquilo foi como um desprestígio à sua profissão. Faltou humildade. Pois bem, essa questão foi levada ao CNJ, que não julgou o processo naquela data porque houve um pedido de vista, argumentando que o prédio não havia segurança, que ele podia cair. Entretanto, temos o laudo de duas perícias dizendo que não havia perigo algum. Agora, estamos enviando as perícias e vou propor ao CNJ que aceite uma sustentação oral da minha parte. Vou explicar que isso não é verdade. Eu até montei o meu gabinete lá e despacho normalmente. E até hoje o prédio está em pé! 



O sr. participou da abertura do Ano do Judiciário, no início do mês, em Brasília. Quais são as diretrizes para este ano?

Em nível nacional, eles vão incrementar a questão do pacto social. Ou seja, Executivo, Legislativo e Judiciário vão trabalhar no sentido de transformar a estrutura e os meios de condução do trabalho do Judiciário para que seja mais hábil e eficiente. Esse é o grande mote deste pacto, em que os poderes se somam para melhorar o desempenho do Judiciário.



O TJ conseguiu cumprir toda a atualização de processos solicitada pela Meta 2?

O TJ de Goiás é exemplo para o Brasil. Cumprimos a Meta 2 e devemos ultrapassar os 90%. Na ocasião em que o ministro Gilmar [Mendes, presidente do STF] deu a notícia, ocupávamos o segundo lugar no País, com 84% da meta atingida. Agora, o prazo foi prorrogado até março e alguns juízes até suspenderam as férias para cumprir a Meta 2 até março. E por falar em juízes, sempre digo que os juizes goianos são os mais preparados do país, são os mais inteligentes e mais independentes. Concluímos agora os concursos dos cartórios, que é um ponto sensível, e somos hoje o segundo Estado do Brasil a concluir o processo. O outro foi o Pará. 



No ano passado, a imprensa mostrou que havia processos até no banheiro de um dos prédios do Tribunal. O que tinha de verdade naquilo?

Eu diria que aquilo foi uma brincadeira de mau gosto de algum funcionário mal humorado. É verdade que o prédio é pequeno, mas tem acomodações para isso. Alguém fez uma brincadeira sem graça, talvez inspirada na “Turma da 85”. Não existe isso. Temos instalações dignas. Não há necessidade de se colocar processos no banheiro. 



A situação do presídio Odenir Guimarães, o antigo Cepaigo, é precária, conforme foi noticiado. Como o Judiciário acompanha a situação do sistema prisional goiano? De quem é a culpa, do Executivo?

É verdade que a construção dos presídios é da alçada do Executivo, mas a administração é da alçada do Judiciário. Compete ao Judiciário não deixar que os presídios cheguem a tal estado de degradação. Se há uma degradação, hoje, o Judiciário tem sua parcela de culpa, sim, pois, como como poder, tem condições - e se não tem, pode criá-las -, para impor o resguardo da saúde do preso e sua segurança pessoal.



O TJ pretende cobrar um posicionamento do Executivo? 

Sim, mas dentro do limite da recomendação. Até porque o Judiciário não pode intervir naquilo que é da alçada do Poder Executivo. Mas não podemos deixar de mostrar aos responsáveis pela construção dos presídios a necessidade de que sejam administrados de forma a atender a dignidade  humana.



O sr. acredita que o sistema prisional recupera o preso?

Esta é e sempre será uma pergunta difícil. Ao longo de meus 23 anos como advogado criminalista, percebi que há sempre uma parcela que, na cadeia, encontra os seus iguais de infortúnio, que vão trabalhar com a revolta contra a estrutura social que os conduziram para a cadeia. E nestes casos, a recuperação é difícil. Já vi alguns se recuperarem, sim, mas também vi muitos padecer na cadeia até a morte. 



O sr. se preocupa com a questão da formação dos bacharéis de Direito? 

Preocupa e muito. Entretanto, o culpado por esta deficiência não é apenas a faculdade, porque o sujeito pode se formar em uma faculdade muito boa e ser um péssimo profissional. Acima de tudo está a vocação e o compromisso com a magistratura. Isso, sim, pode definir um bom profissional . E para isso os concursos têm um papel fundamental. Agora, penso que precisamos reformular a forma como eles são feitos. Recentemente, conversei com a OAB e sugeri mudanças na base de interpretação do que seja um concurso para juiz. Não é possível que num concurso em que se disputa 37 vagas, não seja possível preenchê-las numa seleção que envolvem quatro mil candidatos. E é o que tem acontecido. Tem sobrado vagas concursos que fazemos. Está na hora do Judiciário parar e fazer uma reflexão do que está havendo. Não é possível que no meio de quatro mil tenham só 15 privilegiados, por exemplo, Isso não é possível. O mundo não é tão burro assim! Talvez a forma de fazer ou a filosofia do concurso não condiza mais com a realidade. Se a gente não fizer coro para pensar um novo modelo, vamos continuar tendo déficit de juízes. Agora, isso também não significa que vamos simplesmente abrir as cancelas. Aprovar indiscriminadamente. 



Até que ponto é positivo a juventude ter o poder nas mãos?

Isso é bom em todos os sentidos porque não acontece somente no Judiciário. Se você olhar concursos para promotor, delegado, procurador e demais áreas, você vai encontrar vários candidatos com cara de bebê 'Johnson', quase que saídos da adolescência, e isso está no mundo inteiro. Entretanto, compete a esta geração, inclusive a minha, que esta praticamente saindo de cena, saber aproveitar este potencial e conduzir esta juventude, que está levando o mundo para uma revolução silenciosa. Se não houver acompanhamento e disposição de nós, os mais vividos e experientes, eles poderão de repente não trilhar o caminho certo por determinado tempo. Antes que haja um desvio, é necessário que nós nos disponhamos a conduzi-los. É preciso colaborar com eles. É muito salutar a juventude, é fato que, devido à falta de experiência, há uma ou outra decisão precipitada, mas isso não é nada que comprometa a estrutura social e as finalidades das ações do Judiciário.