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Entidade nacional de juízes repele crítica de Gilmar Mendes

A Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil) divulgou Nota Pública, assinada pelo presidente da entidade, Fernando Cesar Baptista de Mattos, na qual rejeita com veemência, uma vez mais, declarações do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, consideradas ofensivas à magistratura federal.



Em entrevista à Folha, publicada na edição desta segunda-feira (22), Mendes afirma que o momento mais dramático de sua gestão, que se encerra no próximo dia 23 de abril, foi o habeas corpus ao banqueiro Daniel Dantas. Sem citar nomes, o presidente afirma que houve, no caso, um “conúbio espúrio de polícia, juiz e membro do Ministério Público” e “talvez coisas que saibamos e que serão reveladas”.



Na nota, a Ajufe diz esperar que o ministro Gilmar Mendes venha a público dizer o que sabe. “Ao relembrar esse triste episódio, o ministro Gilmar Mendes, apartado da realidade, mais uma vez ataca desnecessariamente a magistratura federal".



Eis a íntegra da manifestação:



Nota Pública:



A Associação dos Juízes Federais do Brasil – AJUFE, entidade de âmbito nacional da magistratura federal, vem a público, uma vez mais, manifestar sua veemente discordância em relação a afirmações feitas pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, as quais demonstram desrespeito para com magistrados federais.



Ao ser entrevistado pelo jornal “Folha de S. Paulo” (edição de 22 de março de 2010), Sua Excelência diz que o momento mais dramático de sua gestão foi por ocasião da decisão sobre o habeas corpus impetrado em benefício do banqueiro Daniel Dantas, ocasião em que “houve uma decisão do STF. E menos de 24 horas depois já havia uma outra ordem de prisão em claro descumprimento à decisão do STF. Daí ter sido dado um novo habeas corpus. Depois os fatos vieram a revelar o envolvimento político da polícia. Envolvimento de Ministério Público e juiz. E talvez coisas que não saibamos e que serão reveladas”.



Em outro momento da entrevista, Sua Excelência, ao dizer que os conflitos às vezes são necessários, afirma que “ali se mostrou que havia um tipo de conúbio espúrio de polícia, juiz e membro do Ministério Público. As investigações provaram que os juízes estavam se sublevando contra pedido de informação feito por desembargador”.



Pois bem. Nenhuma dessas afirmações procede. Como a AJUFE já se manifestou anteriormente, conquanto se reconheça ao ministro o direito de expressar livremente sua opinião, essas afirmações são desrespeitosas aos juízes de primeiro grau de São Paulo, aos desembargadores do Tribunal Regional Federal da Terceira Região e também a um ministro do Supremo Tribunal Federal.



Ocorre que, em relação aos habeas corpus concedidos ao banqueiro Daniel Dantas, especialmente o segundo, jamais houve qualquer afronta ou sequer tentativa de afrontar-se decisão monocrática do senhor ministro presidente do Supremo Tribunal Federal. Tanto isso é verdade que o ministro Marco Aurélio, um dos membros mais antigos e respeitados da Corte, denegou a ordem, reconhecendo a existência de fundamento para a decretação da prisão. Portanto, rejeita-se com veemência essa lamentável afirmação.



No que toca à infeliz menção ao comportamento de juízes quanto a pedido de informações de desembargador, a AJUFE lembra que proposta de abertura de procedimento disciplinar contra cinco juízes federais que atuavam em varas federais criminais de São Paulo foi rejeitada pelo Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, pela amplíssima maioria de 15 votos a um, restando isolado o Corregedor-regional da Justiça Federal da Terceira Região. Esses juízes federais tiveram suas defesas promovidas pela AJUFE, que demonstrou a impertinência do procedimento. Ao contrário do que afirma o ministro Gilmar Mendes, nenhuma investigação confirmou que juízes estivessem se sublevando contra pedido de informação de desembargador. Isso ficou evidente no julgamento, destacando-se que o comportamento dos juízes criminais foi elogiado por diversos membros da Corte Federal.



Ao relembrar esse triste episódio, o ministro Gilmar Mendes, apartado da realidade, mais uma vez ataca desnecessariamente a magistratura federal. Se ele sabe de qualquer fato, que o diga claramente, mas não ponha em dúvida o comportamento de honrados juízes e juízas federais com evasivas e afirmações desprovidas de provas.



Além disso, é imperioso lembrar que quando o Corregedor-regional da Justiça Federal da Terceira Região quis abrir investigação sobre o procedimento de 134 juízes que subscreveram manifesto em favor da independência funcional da magistratura, por ocasião da decretação da prisão e soltura do banqueiro Daniel Dantas, o então Corregedor-Geral da Justiça Federal, ministro Hamilton Carvalhido, atendendo a requerimento da AJUFE, trancou essa iniciativa, tão absurda que era.



É importante lembrar, ainda, que o próprio ministro Gilmar Mendes, em troca de correspondência com a AJUFE, afirmou que ao encaminhar cópia de sua decisão para o Conselho Nacional de Justiça e para a presidente do Tribunal Regional Federal da Terceira Região o fazia apenas para fins estatísticos.



As afirmações do ministro Gilmar Mendes de que havia um “conúbio espúrio [sic] de polícia, juiz e membro do Ministério Público” deve ser repelida com veemência, pois além de ser desprovida de comprovação fática, é atentatória à garantia da independência da magistratura, a qual o senhor ministro, por ser presidente da mais alta Corte de Justiça do País, deveria defender.



Volta-se a repetir que, se o ministro reconhece, como o fez ao ser sabatinado pela Folha de S. Paulo há um ano, que suas manifestações servem de orientação em razão de seu papel político e institucional de presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, deve reconhecer também que suas afirmações devem

ser feitas com a máxima responsabilidade.



Brasília, 22 de março de 2010.

Fernando Cesar Baptista de Mattos



Presidente da AJUFE