Entidades ligadas aos direitos humanos comemoraram a aprovação na quarta-feira (20), pela Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei 6222/05, que define novas regras para a adoção de crianças e adolescentes. O texto, que segue para análise do Senado, é considerado muito avançado especialmente por limitar o tempo de abrigamento, restringir a adoção por estrangeiros e "colocar a adoção no contexto da convivência familiar e comunitária", conforme definiu o secretário-executivo do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), Benedito dos Santos.
O secretário destacou ainda a "pluralidade" das discussões que levaram o relator, deputado João Matos (PMDB-SC), a elaborar seu relatório. "Concordamos com 95% das propostas, que foram apresentadas por diversas entidades, além do próprio Conanda", disse. A única divergência manifestada por Santos foi quanto à retirada do texto da possibilidade de pares homossexuais adotarem crianças. "Acho que poderíamos avançar e permitir que a criança, por exemplo, pudesse ter direito à herança pelos dois lados, mas o texto final não impede que um homossexual adote individualmente."
União civil
O argumento utilizado por João Matos para retirar a possibilidade de adoção por parte de pares homossexuais foi o de que a legislação nacional não reconhece a união civil entre pessoas do mesmo sexo. Santos, no entanto, considera que a Constituição já aceita "a união estável como união real", mesmo que entre homossexuais, uma vez que não há a discriminação.
Esse, no entanto, não é o entendimento do coordenador da campanha de incentivo à adoção Mude um Destino, da Associação dos Magistrados Brasileiros, Francisco Oliveira Neto, que também é vice-presidente da associação. Ele admite que há divergências nas regras atuais, mas considera que o assunto ainda precisa ser "amadurecido" na sociedade. "A grande dificuldade é explicar que uma criança possa ter dois pais ou duas mães, uma vez que há o consenso de que a constituição familiar se dá com um homem e uma mulher sendo os pais de uma pessoa", argumentou.
Neto salienta ainda a importância do "gesto político" de se criar um capítulo específico para a adoção no âmbito do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - Lei 8.069/90) - conforme o projeto - para consolidar a legislação que estava esparsa. "Muitas questões poderiam ser implantadas por mecanismos administrativos, mas a elaboração de uma lei própria fortalece muito o tema no Brasil", definiu.
Tempo de abrigo
O magistrado destacou especificamente a limitação em dois anos do período em que a criança pode ficar abrigada, porque atualmente, segundo ele, as famílias buscam adotar crianças de até três anos de idade, e a permanência indefinida prejudica o processo, já que as crianças envelhecem.
O deputado João Matos lembra que o tempo médio de abrigamento das crianças chega a quatro anos. "É uma situação muito delicada, e o texto que foi aprovado é um dos mais modernos do mundo no que diz respeito aos prazos, tanto que fomos procurados por vários países da América Latina para conhecer a proposta", acrescentou.
A deputada Maria do Rosário (PT-RS) também destacou que o projeto "foi fruto do diálogo da Câmara dos Deputados com o governo brasileiro e inúmeras instituições" e tem como principal objetivo prevenir o abandono. "Os mecanismos que compõem o substitutivo se iniciam pelo direito à família e à convivência familiar, no entanto, cerca de 86% das crianças abrigadas no País possuem família, sendo que 58% mantêm vínculos familiares", citou. "Contudo, mais da metade das crianças que estão nos abrigos brasileiros se encontram ali porque suas famílias são pobres ou por motivos socioeconômicos precários, articulados com novas situações de alcoolismo, de uso de drogas e da violência familiar", concluiu.