Reunidos em Copacabana, no Rio de Janeiro (RJ), representantes de tribunais constitucionais de mais de 120 delegações de 90 países, além de 18 órgãos ou conferências internacionais ligadas ao tema, discutem até amanhã (18) a “Separação dos Poderes e a Independência das Cortes Constitucionais e Órgãos Equivalentes”.
O Brasil, sede do evento, está representado pelo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Cezar Peluso, e pelos ministros do STF Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski.
Também participaram da mesa de abertura do evento o prefeito da cidade do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, e o vice-presidente da República, Michel Temer. Eles deram as boas-vindas aos participantes e falaram sobre os desafios e a evolução da democracia no Brasil.
Durante a abertura, na manhã desta segunda-feira (17), o ministro Peluso falou sobre a importância e o crescimento da democracia em escala mundial, e a cooperação internacional entre as cortes, especialmente com o aumento da interdependência entre as nações. Peluso lembrou os 20 anos da Comissão de Veneza, completados em 2010, que “não por acaso coincidiram com a propagação e a cristalização da democracia ao longo do planeta”.
O presidente do STF ressaltou o papel das instituições jurídicas na manutenção da democracia, afirmando que “um sistema legal sólido garante a segurança jurídica e a rápida solução de controvérsias”. Peluso falou ainda sobre a relação entre a solidez do Estado Democrático de Direito e das instituições jurídicas e a superação de crises, como a que ocorreu no ano passado.
Ao se referir especificamente ao evento, o ministro enumerou os dois principais “remédios” para conter o abuso de poder do Estado – a Justiça Constitucional e a separação dos Poderes – e, a partir de uma citação de Montesquieu, afirmou que “não há liberdade se o Poder Judiciário não está separado do Legislativo e do Executivo”. Peluso falou também sobre a participação do STF e do Poder Judiciário brasileiro nas “transformações positivas” e na consolidação da democracia no Brasil.
Ao concluir, dizendo que o congresso é uma celebração da liberdade, o ministro também falou sobre a harmonia entre os Poderes e anunciou o planejamento de continuidade dos Pactos Republicanos, que são acordos formais entre os chefes dos três poderes. O próximo, que deverá ser o terceiro no Brasil, deve buscar formas de se garantir o acesso a uma Justiça rápida e eficiente.
Antes de Peluso, discursou o presidente da Comissão de Veneza, Gianni Buquicchio. Ele falou sobre a comissão e afirmou que o apoio à democracia vem aumentando no mundo. Ele informou que o grupo é formado por juízes e professores constitucionais e que está disposta a colaborar com as cortes. Ele chamou a atenção para o “dever da ingratidão”, em que o juiz deve agir conforme a Constituição e a consciência, e com independência, sem ceder à pressão de políticos (que os nomeiam) ou até à mídia.
Buquicchio citou a decisão da corte constitucional da Hungria abolindo a pena de morte como exemplo de decisão relevante de tribunal constitucional que “significativamente promoveu a democracia, a proteção do direito humano e do Estado de Direito”, mas lamentou que também haja decisões menos convincentes.
“Decisões tomadas por tribunais constitucionais devem ser bem apresentadas e devem ser justas”, reforçou. O presidente da Comissão de Veneza reconheceu que essa não é uma tarefa fácil – “Quem consegue resistir à pressão política a não ser vocês?” Ainda em relação à imparcialidade, ele falou sobre o fato de os juízes não se manifestarem publicamente, “mesmo quando sentem vontade de gritar”, sobre casos que poderão vir a julgar.
Para que os juízes consigam cumprir obrigações como essas, Buquicchio defendeu que “o juiz não é uma ilha” e ressaltou a importância de seus pares, especialmente de outros países, e da troca de experiências, pois certamente já passaram por problemas semelhantes e, às vezes, já solucionados.
Solidariedade
Ao iniciar sua fala, Peluso manifestou solidariedade às vítimas das inundações no estado do Rio de Janeiro e destacou a capacidade dos cariocas, dotados de “forças incomuns” para superar as adversidades. O presidente da Comissão de Veneza também lamentou a tragédia e pediu que todos se levantassem em memória das vítimas. Michel Temer e Eduardo Paes também apresentaram seu pesar às vítimas.
II Congresso
Durante o evento, as delegações se reunirão em quatro sessões plenárias: a primeira para apresentar e discutir o tema central propriamente dito; a segunda para a apresentação e a discussão dos três temas correlatos; a terceira para o relatório geral; e a última para a apresentação do Projeto de Estatuto da Conferência Mundial e encerramento do evento.
Além do tema principal, já apresentado e discutido em sessão plenária na manhã desta segunda-feira, os participantes do Congresso discutirão os temas A Independência do Tribunal Constitucional como instituição; A independência do juiz individual; e Os procedimentos dos tribunais como garantia de independência.
Para isso, os representantes das cortes e órgãos internacionais serão divididos em três grupos de trabalho, de acordo com características regionais ou linguísticas, e com sistema judicial adotado. Cada grupo terá um presidente e um relator. O que discutirá o tema “A independência do Tribunal Constitucional como instituição” será presidido pelo ministro Gilmar Mendes.
Depois de discutirem, os grupos apresentam seus relatórios na segunda sessão plenária, prevista para a manhã desta terça-feira. À tarde, será feito o resumo e o relatório final.
Os conferencistas também discutirão o projeto de Estatuto, que deve prever, entre outros, os objetivos, a composição, a periodicidade de realização de congressos, e os órgãos – Assembleia Geral, Mesa, Secretariado - que constituem a Conferência Mundial de Cortes Constitucionais.
História recente
A escolha do Brasil como sede ocorreu em 2009, durante a VII Conferência Iberoamericana de Justiça Constitucional, realizada no México. Com apoio unânime dos países iberoamericanos, que formam um dos grupos da Conferência Mundial, a candidatura do País foi endossada pela Comissão de Veneza, fundadora da Conferência Mundial de Cortes Constitucionais.
A Comissão de Veneza –Comissão Europeia para a Democracia através do Direito – tem 57 membros, incluindo países não europeus, e é responsável por assessorar o Conselho da Europa em questões constitucionais. Criada em 1990, passou a contar com o Brasil como membro em 2009, mesmo ano em que foi criada a Conferência Mundial, com a realização do primeiro congresso, na Cidade do Cabo, África do Sul.
A criação da Conferência Mundial de Cortes Constitucionais como órgão permanente materializa as ações da Comissão de Veneza, que desde 1996, vem ampliando para além da Europa a cooperação judicial entre países na área constitucional.
Leia a íntegra do discurso do ministro Cezar Peluso na cerimônia de abertura do evento.