Associação dos Magistrados do Estado de Goiás

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Jornal repercute positivamente primeira sentença em Goiás que autoriza adoção por duas mulheres

Jornal Diário da Manhã, coluna Cidades, edição do dia 11/06/2009:


AGLT e magistrada elogiam sentença. Católicos não reconhecem vínculo.


A primeira adoção por um casal homossexual em Goiás repercute de maneira positiva entre os entrevistados pelo DM. Porém, para a Igreja Católica, não pode constituir uma verdadeira família o vínculo entre dois homens ou entre duas mulheres. Matéria exclusiva publicada ontem pelo DM mostrou decisão inédita do juiz Maurício Porfírio, do Juizado da Infância e Juventude de Goiânia (JIJ).


O magistrado deferiu a primeira sentença no Estado para a adoção de uma menina por duas mulheres, a funcionária pública federal E.M., 49., e a bibliotecária A.L.S., 34. A adotada tem 2 anos e 10 meses e mora desde abril de 2008 com as beneficiadas.


O casal afirma que decidiu adotar não para levantar bandeira pela causa homossexual, mas pelo sonho de constituir uma família. “Toda adoção é um parto doloroso. São várias angústias que passamos nesse processo”, diz a bibliotecária A.L.S. Para a funcionária pública federal E.M., após adotar um menino, que hoje tem 4 anos e um mês, descobriu uma mãe que não existia. “Não sabia que era capaz de amar tanto. Tive certeza do quanto Deus me ama.” O menino e a menina adotados são irmãos biológicos e agora tornam-se irmãos legítimos. Segundo o presidente da Associação Goiana de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (AGLT), Leo Mendes, a entidade está feliz pela criança, pelas mães e pela decisão do juiz. A adoção de crianças por casais do mesmo sexo é uma das reivindicações do Plano Estadual de Políticas Públicas, aprovado no ano passado em Goiás.


Leo reinvidica que é preciso agora que parlamentares federais deixem de lado preconceitos religiosos e garantam o direito de cidadania a 12 milhões de homossexuais no Brasil, aprovando a criminalização da homofobia, a união estável de casais do mesmo sexo, o uso de nome social por travestis e transexuais e o direito de adoção por casais de homossexuais. “Essa decisão mostra que mais um tabu de ordem fundamentalista religiosa é vencido.”


Leo afirma que todas as pesquisas mostram que crianças criadas por casais do mesmo sexo crescem com mais amor e carinho e sabem lidar mais com os preconceitos da vida. “Não se tem notícia até hoje de nenhuma criança adotada por casais do mesmo sexo que tenha se tornado homossexual. A orientação sexual dos pais ou mães não influencia em nada a orientação sexual que os filhos terão.”


Conta que os pais dele eram heterossexuais, tiveram oito filhos, todos criados de maneira igual, e apenas ele é homossexual. “O casal de mulheres agiu da forma correta.” Para ele, se ter uma mãe já é bom, imagine ter duas? “Essa criança é uma privilegiada em ter duas mães de criação. A decisão do juiz goiano permitirá que um maior número de crianças tenha um lar, uma família, educação, saúde e lazer.”


Cidadania


A decisão harmoniza o princípio do Estado maior: da dignidade da pessoa humana. Isso é sinônimo de cidadania e inclusão. Esse é o entendimento da juíza da 2ª Vara de Sucessões Cível e diretora cultural da Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (Asmego), Maria Luiza Póvoa. Segundo a magistrada, o ordenamento jurídico brasileiro não discrimina nem faz opção de sexo, raça ou cor, por isso todos indivíduos devem receber o amparo do Poder Judiciário.


Maria Luiza parabeniza a decisão inédita e a postura de cidadania do juiz Maurício Porfírio. Ela afirma que o magistrado deve buscar o princípio constitucional do melhor interesse do menor. “E o melhor interesse não é o abrigo do juizado, mas, sim, uma família de pais para a criança.” A juíza reconheceu, em uma decisão inédita, em 2006, que o juízo da Vara de Família é competente para processar ações que envolvem uniões do mesmo sexo. A sentença foi confirmada pelo Tribunal de Justiça de Goiás.


“A Igreja não concorda com tal decisão”, diz religioso


Para o padre Luiz Henrique Brandão de Figueiredo, o documento Matrimônio, Família e Uniões de fato nº 23, do Conselho Pontifício para as Famílias, diz que não pode constituir uma verdadeira família o vínculo entre dois homens ou entre duas mulheres, e muito menos se pode atribuir a essa união o direito de adotar crianças sem família. “Por isso a Igreja não concorda com tal decisão. A Igreja respeita e acolhe indivíduos com tendências ou práticas homossexuais, mas não concorda com o fato de eles adotarem uma criança.”


O vigário diz que a composição da família é uma instituição natural. Por isso, a própria ordem que regula a natureza humana, chamada também de lei natural, prevê, em todos os níveis – psicológico, afetivo, sexual e anatômico entre outros –, que há verdadeira complementaridade somente entre um homem e uma mulher. “Por simples argumentos da reta razão, vemos que uma verdadeira família só pode ser constituída pela união heterossexual, entre um homem e uma mulher.”


Para o sacerdote, a decisão gera uma jurisprudência que pode no futuro influenciar nas decisões de outros juízes. Acaba por defender que uma união homoafetiva pode ser comparada com a união entre um homem e uma mulher, o que não é verdade. Ressalta que equiparar as duas uniões significaria, no mínimo, descaracterizar as razões mais profundas da união entre o homem e a mulher, com seus dois fins principais: o bem dos cônjuges e a transmissão da vida, que estão ausentes numa união homoafetiva. “O crescimento e o amadurecimento das crianças adotadas por homossexuais estariam seriamente comprometidos.”