Associação dos Magistrados do Estado de Goiás

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Juiz fala sobre sugestão de plano nacional de comunicação para o Judiciário


O uso eficiente dos canais de comunicação para divulgação de iniciativas da Justiça esteve no centro das discussões do Encontro Nacional de Comunicação do Poder Judiciário, realizado pelo Conselho Nacional de Justiça, em Brasília, nos dias 25 e 26 de fevereiro.


O Diretor de Comunicação da Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (ASMEGO), juiz André Reis Lacerda, participou do encontro e apresentou sugestão à coordenação do evento para a instituição de um plano nacional de comunicação aos tribunais do País, com o objetivo de dar mais transparência ao trabalho do Judiciário e alcançar a sociedade destinatária dos serviços.


Sobre essa sugestão, André Lacerda falou ao portal Rota Jurídica como deve ser esse plano, as metas e a necessidade de um melhor relacionamento entre Judiciário e imprensa.


Confira a entrevista.


Rota Jurídica - Qual o objetivo desse plano de comunicação?


O objetivo do plano de Comunicação sugerido ao Conselho Nacional de Justiça é que o referido órgão administrativo de cúpula do Poder Judiciário, em sua atribuição de consolidar metas e padronização de rotinas com vistas à melhoria do Sistema de Justiça em âmbito nacional, possa definir estratégias eficientes de Comunicação dos Tribunais para com toda a sociedade, meios de mídia, além dos demais Poderes e órgãos. Com uma padronização mínima de rotinas, estruturação mais adequada de assessorias de imprensa, alocação de recursos específicos e necessários para a divulgação dos trabalhos realizados pelo Poder Judiciário como um todo, objetiva-se que a população em geral possa ter uma visão bastante melhorada quanto à imagem institucional da Justiça.


RJ – O que motivou a apresentação dessa meta?


A motivação de apresentação desta meta, que poderá ser dimensionada por meio da edição de uma Resolução do CNJ, é justamente a constatação de que vários Estados da Federação e Tribunais em Geral ainda não possuem uma estrutura comunicativa própria e devidamente equipada. Goiás já pode contar com uma boa equipe de comunicação e com profissionais compromissados que se desdobram para poder cobrir todo o Estado com uma estrutura enxuta. Entretanto, há distorções se formos comparar as estruturas disponíveis em órgãos federais e também há Estados que nem mesmo dispõe de uma assessoria de Comunicação institucionalizada. A meta vem, justamente, para poder lançar luz para uma necessidade premente do Poder Judiciário, de dotar suas equipes técnicas de comunicação de melhores condições de trabalho, abrir um canal para a cultura de que o magistrado precisa se comunicar melhor com a sociedade e também para fomentar estratégias eficientes de ocupação de espaços positivos da Justiça na mídia em geral.


RJ – Em que consiste esse plano?


O plano, a meu ver, precisa ainda ser bastante amadurecido. O Encontro Nacional de Comunicação do Poder Judiciário, com enfoque em mídias sociais, foi bastante oportuno até mesmo para demonstrar que os Tribunais precisam conversar melhor, inclusive entre si. É do intercâmbio de boas práticas comunicativas que resultará um consistente plano de gestão nesta área e com indicativos que preservem as identidades de cada região do Brasil e também as peculiaridades de cada segmento da Justiça. Por outro lado, hoje, são inúmeras as ferramentas com as quais pode se valer o Judiciário para ter uma melhor interlocução com o público interno e externo. Uma coisa é se comunicar com as classes dos advogados, promotores de Justiça, procuradores, além da melhoria da comunicação com os próprios servidores da Justiça e magistrados. Outra é a comunicação, que deve ser feita para os jurisdicionados que possuem processos em tramitação, mídia e população em geral. Como é básico em uma boa comunicação, primeiro devemos identificar quais nossos públicos alvos, o que pretendemos divulgar e estudar qual é melhor maneira de fazermos isto. Não é novidade para ninguém que hoje são múltiplas as formas e potenciais de meios de mídia a serem explorados e vemos vários órgãos do Poder Judiciário fazendo este trabalho de forma exemplar, a exemplo do Supremo Tribunal Federal e também do Tribunal Superior Eleitoral, que, além de campanhas eficientes e criativas de TV, usam de forma adequada espaços nas emissoras de rádio mais elitistas e também populares; fomentam programas na criada TV Justiça, jornais impressos e eletrônicos; além de utilizar canais interativos, como seus próprios sites e redes sociais (Facebook, Twitter, dentre outros). De toda a sorte, o que a Asmego fez foi sugerir a criação deste plano geral e nacional que, conforme o Conselheiro do CNJ, será devidamente estudado para a elaboração de uma resolução do órgão nesta perspectiva.


RJ – Os tribunais ainda não sabem lidar com comunicação externa?


Em geral, precisamos ainda aprender a nos fazermos mais claros. Há muitas variáveis a serem levadas em consideração e a atividade exercida pelo Judiciário, por si só, é bastante complexa, não necessariamente palatável à maioria da população. O próprio sistema jurídico, com seus inúmeros órgãos e divisões, a tecnicidade necessária para tratar inúmeros institutos jurídicos, a linguagem hermética e a infinidade de normas jurídicas dificultam sobremaneira uma exposição mais simples e direta do papel e atividades do Poder Judiciário. Somado a isto, o juiz, sobretudo em se considerando os casos concretos, muitas vezes é impedido de se pronunciar, sob pena de demonstrar pré-julgamento ou mesmo quebrar sua isenção para julgar determinada matéria, o que precisa ser compreendido pela população. Muitos são os juízes que tentam se colocar perante a mídia desta forma mais engajada, com a compreensão de que nós precisamos nos adaptar aos novos tempos. Isto é uma questão que deveria ser institucionalizada e incentivada com critério, de se seguir uma política institucional e não partir de atitudes isoladas de alguns juízes apenas. Não se está aqui falando que o juiz tem que sair falando de tudo e sobre tudo. Ele corre muito risco se fizer isto e o que deve pautar a atividade do Judiciário é a ponderação. Entretanto, uma coisa é o caso concreto que o juiz deve dizer o mínimo possível, outra coisa é a matéria afeta à gestão, aos procedimentos de cartórios, ao que o povo quer saber, que é a melhoria da prestação de serviço e entrega da prestação jurisdicional de forma mais rápida ou, se não é possível pelo próprio sistema, saber o porquê disto. No geral, ainda existe uma cultura geral de retração que precisa ser quebrada. Vivemos em um mundo que velocidade da informação, acessibilidade e transparência são palavras-chave. O cidadão não mais se conforma com burocracia e distância e nos cobra isto a cada dia. Daí, precisamos aprender rápido a nos comunicar de forma mais eficiente, sermos mais objetivos nos relatos para dar conta do excessivo volume de serviço, criar uma cultura pedagógica para a população de como realmente funciona o processo, além de demonstrar a estatística dos magistrados, as boas práticas judiciárias, fazendo-se uma comparação com demais segmentos da Justiça e outros Estados. Por exemplo, não se pode comparar um serviço estatal de tamanha importância e complexidade como é um julgamento da vida de uma pessoa com um serviço que se paga e pode-se exigir em 24 horas. A despeito da necessidade de o Judiciário precisar se organizar para diminuir o gargalo da morosidade, sentença não é algo que pode ser feito sem o cuidado necessário e o respeito aos prazos legais. Agora, o que precisa mudar não são só os mecanismos de gestão dos processos para que eles tramitem de forma mais ágil, mas, sobretudo, a forma como comunicamos com a população. Como é o tipo de trabalho a ser realizado, o que depende do Poder Judiciário e o que depende de outros agentes, como os legisladores, advogados e os próprios jurisdicionados. Importante ocupar os espaços na mídia em prol de um Judiciário cada vez mais respeitado, o que deve ser encarado com planejamento, objetivos definidos e com a maior seriedade e prioridade possíveis por todos os agentes envolvidos no tema.


RJ - Em sua opinião, os juízes devem passar por Mídia Training e o que o Judiciário ganharia com um melhor relacionamento com a imprensa?


Sim. Tanto os juízes substitutos, quando dos cursos de vitaliciamento (que é o curso de formação inicial quando do ingresso na carreira), quanto todos nós, de forma a contemplar um plano de formação continuada. Assim como o mundo é dinâmico, a comunicação também vem passando por transformações significativas. A título de exemplo, hoje são 61 milhões de brasileiros os usuários de Facebook. Isto constitui 1/3 (um terço) de toda a população brasileira. Creio que mais de 50% dos formadores de opinião hoje se inserem nas redes sociais e em estatísticas como esta. Então, como não se preparar para se comunicar de maneira adequada com este público? Presumir que sempre irão nos interpretar da maneira mais adequada é um erro capital. Daí a necessidade de nos aperfeiçoarmos também nestas ferramentas que não deixam de ser práticas de melhor gestão. A título de exemplo, não basta só saber como se portar perante as perguntas dos jornalistas (que sempre estão nos demandando com entrevistas, dada a importância dos fatos julgados pela Justiça). É essencial poder ter uma noção cada vez mais adequada da repercussão dos atos da magistratura perante a sociedade. Se soubermos fazer um filtro adequado, os jornalistas éticos irão cada vez mais buscar publicar as boas notícias que, consequentemente, redundarão na melhoria da credibilidade do Poder Judiciário. De outra parte, há inúmeras técnicas e cuidados que devemos ter, como procurar ser cada vez mais diretos, objetivos, não personalistas e tratando apenas dos fatos justamente para despertar o interesse público. Não só o Judiciário, mas toda a população ganharia com um melhor relacionamento entre o Poder e a mídia. Precisamos ter inteligência emocional o suficiente para entender e incorporar uma constatação muito singela de um fenômeno que ocorre hoje em dia: ninguém discute o poder que a mídia tem de fazer e até mesmo derrubar governos, a exemplo do que se pode constatar na obra Notícias do Planalto de Fernando Moraes, em que se viu o papel da mídia na campanha e governo presidencial de Fernando Collor. Então, a melhor estratégia é ter a mídia como parceira, vendo-a como instrumento de repercussão do interesse público e agir com a mesma de forma sempre direta, republicana, transparente, buscando demonstrar aquilo que temos de melhor sem sucumbir a qualquer capricho somente para vender notícias trágicas - das quais o brasileiro já está cansado.