Possíveis erros formais e materiais ou equívocos de interpretação no curso de um processo não justificam a aplicação de multa por atentado ao exercício da jurisdição
Os magistrados só respondem pelas suas decisões perante a Lei Orgânica da Magistratura (Loman), a menos que fiquem evidentes as hipóteses de dolo, fraude ou recusa intencional em cumprir provimentos judiciais. Assim, possíveis erros formais e materiais ou equívocos de interpretação no curso de um processo não justificam a aplicação de multa por atentado ao exercício da jurisdição, prevista no artigo 14 do Código de Processo Civil. Ainda assim, tudo precisa ser apurado pela Corregedoria de Justiça em sindicância ou processo disciplinar.
Com este entendimento unânime, o 3º Grupo Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul deu provimento a Mandado de Segurança impetrado pela juíza Fabiana dos Santos Kaspary, de Porto Alegre, multada no curso de uma ação exibitória de documentos por se recusar a cumprir decisão do desembargador Jorge Luiz Lopes do Canto. Baseada na orientação de ofício-circular da Corregedoria da Justiça, a juíza ignorou a decisão, proferida em sede de Agravo Instrumento, para aceitar cópia simples da procuração do advogado da parte autora.
O desembargador Giovanni Conti, relator, afirmou não ter encontrado qualquer elemento que pudesse indicar má-fé por parte da juíza. Pelo contrário, ela se preocupou, de maneira excessiva, com a orientação da Corregedoria, que expediu recomendações com o objetivo de evitar fraudes processuais. ‘‘Essa orientação administrativa se trata apenas de uma recomendação e não norma de observância obrigatória. E, mesmo que fosse, teria eficácia para todos os demais processos, mas não para a cautelar de exibição de documentos em comento, pois judicializada a questão, prevalece, obviamente, a determinação judicial", escreveu no acórdão.
Conti observou, por outro lado, que o dispositivo do CPC considera ato atentatório ao exercício da jurisdição quando aqueles que participam do processo deixam de cumprir com exatidão os provimentos judiciais, ‘‘de natureza antecipatória ou final’’. E o julgamento em questão não tem esta natureza, prosseguiu, pois em seu entendimento trata-se de mero exame da petição inicial, com vistas à qualificação processual da parte autora.
"Embora em flagrante descumprimento de decisão superior, verifica-se que as preocupações da impetrante [juíza] tinham efetivo fundamento, uma vez que no momento em que restou interposto o segundo Agravo de Instrumento pela parte autora e gerador da multa aplicada (em 28.01.2014), já havia ocorrido acordo no processo principal (em 03.12.2013), o que evidencia que o recurso interposto era nulo de interesse e zero de objeto lícito, mas cem por cento de mera especulação honorária’’, registrou o desembargador-relator. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 5 de dezembro.
Fonte: Conjur