Associação dos Magistrados do Estado de Goiás

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Juízes não são justiceiros

Gervásio Protásio dos Santos
Presidente da Associação dos Magistrados do Maranhão - AMMA


Juízes não são justiceiros. Não devem agir para satisfazer o espírito de vingança, individual ou coletivo. Não é sua função acusar ou defender quem quer que seja, nem tampouco é seu papel combater a criminalidade nas ruas. A tarefa que lhes foi destinada pela ordem constitucional é a de julgar com uma visão plural, de modo a contribuir, em última análise, para o bem comum.


Cabe ao magistrado, após examinar os fatos, ponderar as suas circunstâncias e formatá-los aos termos da lei, proferir, ao final, uma decisão que solucione o conflito, condenando ou absolvendo a quem está sendo acusado da prática de algum ato ilícito.


Tais atividades devem ser realizadas com absoluta imparcialidade. É o que se espera de um Juiz no Estado Democrático que, ao decidir uma ação, seja cível ou criminal, o faça de forma imparcial, sem ideias pré-concebidas e sempre tendo a Constituição e a lei como norte, evitando as paixões de qualquer natureza.


Ressalta-se: agradar ou desagradar à opinião pública, ou aos membros dos demais Poderes, não se insere na agenda do magistrado. A sua função é, essencialmente, contramajoritária e, muitas das vezes, tem a difícil missão de proteger a sociedade dos seus próprios instintos de “justiça a qualquer preço”.


Essa reflexão é oportuna no atual momento em que o Estado do Maranhão passa por uma crise sem precedentes no sistema de segurança pública e prisional como forma de contrapor os argumentos que, à guisa de escamotear as verdadeiras razões para termos alcançado índices alarmantes de violência, sobretudo na região metropolitana de São Luís, tenta transferir a responsabilidade ao Judiciário.


A surrada cantilena “a Polícia prende, a Justiça solta”, repetida à exaustão por certas autoridades policiais e replicada pela Imprensa em programas sensacionalistas, é um subterfúgio para justificar a incompetência.


Ora, se a prisão for ilegal, a obrigação do juiz é relaxá-la, e se assim não proceder, cometerá ele juiz um ilícito. Portanto, a quantidade de relaxamento de prisão é diretamente proporcional à “qualidade das prisões” realizadas, e abrir exceção a esse controle constitucional, o que por vezes é clamado pela “opinião pública”, é possibilitar que, amanhã, qualquer cidadão de bem seja vitima desse tipo de seletividade.


O que chama a atenção do observador atento, é que os detratores do Judiciário se esquecem de alardear que por falta de investimentos do Executivo ao longo dos anos, há no Maranhão um déficit de mais de duas mil vagas no sistema carcerário; a Justiça manda prender, porém, não há lugar para colocar os presos. Esquecem, ainda, de dizer que há milhares de mandados de prisão expedidos por ordem dos juízes e não cumpridos por falta de pessoal suficiente e de estrutura necessária para rastrear os foragidos ou que as Casas de Internação dos menores infratores estão interditadas por falta de condições mínimas para abrigá-los. E ainda que a briosa Polícia Militar tem apenas a metade do contingente que necessitaria para trabalhar de forma adequada.


Transferir responsabilidades para justificar omissões não solucionará a crise de segurança que estamos imersos. E aqui vale a mesma fórmula para a resolução de qualquer problema, a qual o primeiro passo para resolvê-lo é reconhecer que existe um problema. O segundo é priorizar as medidas que irão solucioná-lo, sem olvidar que, no caso do Maranhão, essas passam necessariamente pela valorização e reconhecimento dos homens e mulheres que compõe a Polícia Militar e Civil do estado.


O leque de medidas que devem ser tomadas pelo Governo do Estado para combater a crise de segurança é extenso, contudo, certamente, entre elas não se encontra a transformação de Juízes em Justiceiros, se isso viesse a ocorrer não teríamos apenas a falência do sistema de segurança pública, mas do próprio Estado Democrático.