Associação dos Magistrados do Estado de Goiás

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“O Estado foi e está sendo omisso no cumprimento de seu dever”, diz juíza sobre superlotação em presídios


Instalações precárias, falta de investimento e funcionários, desrespeito à dignidade humana... Esta é a realidade do sistema prisional em Goiás, segundo a juíza Telma Aparecida Alves, da 1ª Vara de Execuções Penais de Goiânia. Em entrevista ao jornal O Popular domingo passado (12/01), a magistrada escancarou a situação de caos nos presídios do Estado. E ao portal ASMEGO, a magistrada fala sobre causas, efeitos e possíveis soluções para a situação. Leia os principais trechos.


Portal ASMEGO - Qual a razão para a conhecida falta de vagas em presídios em Goiás? Onde está o problema?


Juíza Telma Aparecida Alves - A falta de vagas no sistema prisional é consequência de muitos anos sem investimento em construção ou reforma de presídios ou cadeias públicas. O Presídio Odenir Guimarães, por exemplo, foi construído na década de 1960. Desde então, Goiânia e Região Metropolitana sofrem com a falta de vagas, seja na prisão provisória ou definitiva.


Portal ASMEGO - Onde está o problema?


Juíza Telma Aparecida Alves - A responsabilidade pela administração penitenciária é do Poder Executivo do Estado. O Poder Judiciário não constrói ou reforma unidades prisionais, apenas executa e fiscaliza o cumprimento da pena do condenado. Cabe, então, ao Executivo, o cumprimento de ações positivas para ampliar e humanizar a oferta de vagas nos sistema carcerário brasileiro.


Portal ASMEGO – O Estado se omite?


Juíza Telma Aparecida Alves - O Estado foi e está sendo omisso no cumprimento de seu dever como gestor da custódia dos presos condenados e provisórios. Não somente por falta de presídios, mas também por falta de cela em delegacias e na Casa de Prisão Provisória. As ações fundamentais para amenizar a superlotação seria construir novas vagas em todo o Estado de Goiás, atendendo principalmente as comarcas do interior, o que diminuiria a procura de vaga na capital.


Portal ASMEGO - Há também falta de preparo dos servidores? Há desinteresse em reverter essas condições?


Juíza Telma Aparecida Alves - Em relação aos servidores da administração penitenciária, não acho que há desinteresse. O que me parece é que há falta de preparo do agente carcerário e o seu número é insuficiente. Hoje, a maioria dos agentes concursados está em áreas administrativas, o que levou à contratação de agentes temporários, por tempo limitado, sem preparação adequada e sem vínculo de continuidade no trabalho, o que leva às consequências que vemos atualmente.


 Portal ASMEGO - Falta vontade do Estado em desenvolver políticas eficazes para mudar esse quadro?


Juíza Telma Aparecida Alves - Não diria falta de vontade. Talvez falte consciência da necessidade de também investir na administração penitenciária, como se investe em programas de saúde e educação, visando a diminuição da violência urbana.


Portal ASMEGO - A terceirização dos presídios pode ser uma saída viável? É possível?


Juíza Telma Aparecida Alves - Não tenho ainda opinião formada sobra a terceirização. É uma ação possível, existe em outros países e já está em funcionamento a parceria publico-privada de presídios em um ou dois Estados brasileiros. Porém, a situação é recente. Ainda acho que a situação viável é o próprio Estado administrar a custódia de presos, com certa prioridade em seus programas de administração.


Portal ASMEGO – Sobre a violação de Direitos Humanos, a realidade atual em Goiás fere esse princípio?


Juíza Telma Aparecida Alves - A Constituição garante a todo brasileiro, bem como ao estrangeiro residente no País o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e propriedade. Da mesma forma, é direito do cidadão o acesso a educação, saúde, moradia, entre outros direitos. Levando em consideração a precariedade das instalações físicas, aliada à superlotação dos presídios e cadeias do Estado, pode-se concluir que há um desrespeito pela garantia da dignidade humana, mesmo sendo contra pessoa em condição de marginalidade, como é o condenado. A condenação criminal e sua execução penal podem ser concluídas de forma digna, com o mínimo de condições básicas para tal fim. O que não ocorre, infelizmente, em nosso sistema penal brasileiro.