*Texto de Vladimir Passos Freitas, desembargador federal aposentado, publicado no portal Consultor Jurídico:
Os juízes, na sua grande maioria, não foram preparados para exercer atividades de administração. Não se estuda o Poder Judiciário nos cursos de graduação e nem nos de pós-graduação. O resultado é que juízes, muitas vezes sem qualquer habilidade no trato da matéria, escolhidos pela antiguidade, acabam se envolvendo com temas pouco familiares, como recursos humanos, orçamento e administração pública. Os resultados costumam ficar aquém do desejável.
Nos últimos anos a situação tem melhorado. O Conselho da Justiça Federal promoveu cinco congressos sobre administração da Justiça (2000 a 2005), os Tribunais, por meio das suas Escolas da Magistratura, passaram a preparar os seus juízes e a matéria passou a fazer parte dos concursos públicos da magistratura.
Mas, de qualquer maneira, muito há a discutir e a melhorar. E com este objetivo — e não o de querer ensinar a ninguém — coloco 10 princípios que podem ser úteis aos magistrados com poderes de administração. Eles são a síntese do que vi, ouvi, estudei aprendi e vivenciei ao longo de mais de 40 anos de atividades jurídicas em diferentes atividades, entre as quais não exerci apenas a de oficial de Justiça. Assim, vejamos:
1. O juiz nas funções de administrador, como presidente de Tribunal, vice-presidente, corregedor, coordenador de Juizados Especiais, diretor de Escola de Magistrados, diretor do Foro ou Fórum, ou administrando a sua Vara, deve saber que a liderança moderna se exerce com base na habilidade de conquistar as pessoas e não mais em razão do cargo, perdendo a hierarquia seu caráter vertical para assumir uma posição mais de conquista do que de mando.
2. Ao administrar, cumpre-lhe deixar a toga de lado devendo: a) obrigação à lei e não à jurisprudência; b) inteirar-se das técnicas modernas de administração pública e empresarial; c) adaptar-se aos recursos tecnológicos; d) decidir de maneira ágil e direta, sem a burocracia dos processos judiciais; d) manter o bom e corrigir o ruim; e) delegar, se tiver confiança; f) atender a imprensa; g) lembrar que não existe unidade judiciária ruim, mas sim mal administrada.
3. No âmbito externo, deve prestigiar as atividades da comunidade jurídica e dos órgãos da administração dos três Poderes, participando de solenidades, estabelecendo parcerias em projetos culturais e alianças que possam diminuir os gastos públicos. No âmbito interno, deve visitar periodicamente os setores administrativos, ouvindo os funcionários, demonstrando o seu interesse em conhecer os serviços e atender as necessidades, quando possível.
4. Ter em mente que suas palavras e ações estão sendo observadas por todos e que elas transmitem mensagens explícitas ou implícitas que podem melhorar ou piorar a Justiça. Por isso, devem ser evitadas críticas públicas a outros magistrados de qualquer Justiça ou instância, ou a autoridades de outros Poderes, atitudes estas que nada constroem e que podem resultar em respostas públicas de igual ou maior intensidade.
5. Manter a vaidade encarcerada dentro dos limites do tolerável, evitando a busca de homenagens, medalhas, retratos em jornais institucionais, vinganças contra os que presumidamente não lhe deram tratamento adequado, longos discursos enaltecendo a si próprio ou o afago dos bajuladores, ciente de que estes desaparecerão no dia seguinte ao da posse de seu sucessor.
6. O presidente — e os demais administradores, no que compatível — deve manter um ambiente de cordialidade com os colegas do Tribunal, ouvindo-os nas reivindicações, explicando-lhes quando negá-las e não estimulando os conflitos. Com os juízes de primeiro grau, lembrar que o respeito será conquistado pelo exemplo e não pelo cargo, que eles pertencem a gerações diferentes, que devem ser estimulados na criatividade, apoiados nos momentos difíceis e tratados sem favorecimento. Nas infrações administrativas praticadas por magistrados, cumprir o dever de apurar, com firmeza, coragem e lealdade.
7. No relacionamento com o Ministério Público e a OAB, deve atender as reivindicações que aprimorem a Justiça, não criar empecilhos burocráticos que dificultem as atividades desses profissionais (p. ex. na retirada de processos) e, quando não atender a um pedido, explicar os motivos de maneira profissional evitando torná-lo um caso pessoal.
8. No relacionamento com os sindicatos, manter um diálogo respeitoso, baseado na transparência administrativa. Quanto aos servidores, motivá-los, promover cursos de capacitação, divulgar as suas boas iniciativas, promover concursos sobre exemplos de vida, envolvê-los na prática da responsabilidade social e da gestão ambiental. Com relação aos trabalhadores indiretos (terceirizados), promover, dentro do possível, sua inclusão social.
9. Nos requerimentos administrativos, quando negar uma pretensão, seja de magistrados ou de servidores, fazê-lo de forma clara e fundamentada, não cedendo à tentação de concedê-la para alcançar popularidade, pois sempre haverá reflexos em relação a terceiros e novos problemas.
10. Ter presente que administrar significa assumir uma escolha e um risco e que aquele que nada arrisca passará o tempo do seu mandato em atividades rotineiras, limitando-se ao fim ter um retrato na galeria de fotografias, passando à história sem ter dado qualquer contribuição à sociedade, ao Poder Judiciário e ao Brasil.