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Proposta fala em construção de presídios por réus

Sistema prisional brasileiro: falência Sistema prisional brasileiro: falência

Na investigação relacionada à operação Lava-Jato, MP lançou a proposta como forma de abrandar penas de executivos. Falhas no sistema penitenciário foi o principal argumento para que a Corte da Itália negasse extradição de ex-diretor do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato


Na negociação de acordos de delação premiada e leniência com empreiteiras envolvidas na operação Lava-Jato, o Ministério Público lançou uma proposta arrojada: a exigência de construção de presídios como condição para abrandar penas a executivos e empresas citados no esquema de pagamento de propinas em obras da Petrobras.


Conforme interlocutores que acompanham as conversas, procuradores sugeriram essa contrapartida como forma de solucionar duas questões ao mesmo tempo. Primeiro, as empresas restituem aos cofres públicos, com a realização de grandes obras, parte do dinheiro que teria sido desviado da estatal.


Segundo, contribuem diretamente para melhorar a situação precária dos presídios brasileiros - questão que se tornou uma pedra no sapato do Ministério Público Federal depois que a Corte de Bolonha, na Itália, negou a extradição do ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato. Ele fugiu do país após ser condenado a 12 anos e 7 meses de prisão no processo do mensalão.


O desrespeito aos direitos humanos nas prisões brasileiras foi o único argumento mencionado pelos italianos para negar a extradição. O resultado gerou frustração no Ministério Público Federal, pois todos os argumentos jurídicos apresentados pela defesa de Pizzolato haviam sido negados pelos juízes - o que indicaria uma vitória dos procuradores brasileiros.


A Corte de Bolonha rejeitou, por exemplo, a alegação da defesa quanto à ausência de um duplo grau de jurisdição (impossibilidade de recurso a uma corte superior), assim como questionamentos pelo fato de o processo ter corrido no Supremo Tribunal Federal (STF) mesmo para réus sem foro privilegiado, como o ex-diretor do BB.


Mas foi uma questão estrutural que levou à derrota do Brasil. A defesa de Pizzolato chamou a atenção para a situação do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, no Maranhão, onde motins violentos resultaram na morte de pelo menos 17 detentos desde janeiro. A Corte de Bolonha citou especificamente a morte, este ano, de dois detentos no presídio da Papuda, em Brasília - um dos locais indicados pelo Ministério Público para que Pizzolato cumprisse sua pena - para concluir pela falta de condições do sistema prisional brasileiro para receber um cidadão italiano. O ministro do STF Marco Aurélio Mello chegou a classificar a decisão como "uma vergonha" para os brasileiros.


Foi nesse contexto que advogados das principais empreiteiras do país ouviram, de negociadores da Lava-Jato, a exigência de construção de presídios como possível cláusula de acordos para abrandar as penas do caso. Para as empresas, uma possibilidade seria converter parte do pagamento de multas em dinheiro na realização dessas obras. Para executivos, os acordos de delação podem resultar em regimes mais brandos de cumprimento de penas - em vez da prisão, por exemplo, poderiam prestar serviços comunitários.


Como o Valor noticiou ontem, os acordos de delação premiada e leniência em negociação na Lava-Jato devem ultrapassar R$ 1 bilhão em multas a empreiteiras suspeitas de participação em atividades ilícitas. Parte desse valor poderia ser convertido na construção de presídios. Além de pagar altas quantias, as companhias terão que confessar a participação nas irregularidades e colaborar de maneira efetiva com as investigações. Atualmente, cerca de sete empresas participam das negociações.


Segundo fontes ouvidas pelo Valor, as conversas ainda se dão informalmente e nenhum acordo foi concretizado ainda. Mas se o processo for adiante, será um acordo inédito no Brasil. Do lado das empreiteiras participam advogados, representando os executivos e as empresas. No Ministério Público, as negociações envolvem tanto o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, como integrantes da força-tarefa da Lava-Jato que atuam diretamente na primeira instância, em Curitiba.


Recentemente, o Ministério Público também passou a atacar o problema carcerário por meio de ações judiciais. A intenção é buscar formas de acionar os Estados, cujo problema carcerário é considerado mais grave que o do governo federal, para que implementem políticas públicas na área prisional.


O STF ainda terá que decidir, entretanto, se o Ministério Público tem o poder de entrar com ações na Justiça para induzir a atuação dos Estados, inclusive com a construção de presídios. Os ministros também debaterão se o Judiciário pode obrigar esse tipo de ação por parte do Executivo. Em um processo envolvendo o Estado do Alagoas, o Ministério Público local conseguiu uma liminar para obrigar o governo a implementar medidas nesse setor. O Estado recorreu ao STF, reclamando de ingerência do Judiciário. Procuradores argumentam que não se trata de obrigar o Estado a formular política pública, mas a cumprir a Constituição.



Fonte: Valor