O Superior Tribunal de Justiça encerrou uma disputa judicial de quase três décadas envolvendo a posse de terras localizadas na fronteira dos estados de Mato Grosso e Goiás. Por maioria, a Quarta Turma do STJ concluiu que a ação de manutenção de posse requerida em 1979 pela Linck S/A – Equipamentos Rodoviários e Industriais – está prescrita, pois foi integralmente cumprida em 1981.
A empresa recorreu ao STJ em recurso especial contra o acórdão do Tribunal de Justiça do Mato Grosso que determinou a prescrição e garantiu a posse da fazenda Holândia aos descendentes do holandês Thomas Anthonius Michels. O recurso da Linck foi acolhido pelo relator, ministro Massami Uyeda, mas foi rejeitado pelo ministro Fernando Gonçalves em voto-vista acompanhado pelos ministros João Otávio de Noronha e Luís Felipe Salomão.
Segundo os autos, a disputa judicial começou em 1979 quando a empresa Linck S/A – detentora de título de propriedade emitido pelo Estado de Mato Grosso – ajuizou ação de manutenção de posse contra Thomas Anthonius Michels – detentor de documentação de posse emitido pelo Instituto de Desenvolvimento Agrário de Goiás. A ação foi julgada procedente em setembro de 1980, transitou em julgado em maio de 1981 e a decisão foi cumprida dois meses depois.
No mesmo ano, o Supremo Tribunal Federal começou a discutir um conflito sobre a delimitação da área, localizada na fronteira dos estados de Mato Grosso e Goiás. Em dezembro de 2002, transcorridos mais de 20 anos do cumprimento da ordem judicial, a Linck peticionou informando o resultado do julgamento da ação originária no STF, que fixou os limites entre os estados e reconheceu a área em disputa como pertencente ao Estado de Mato Grosso.
Diante de tal decisão, a defesa da Linck S/A questionou a ocorrência da prescrição executória alegando que a reintegração da posse não teria sido cumprida integralmente, uma vez que a ação de manutenção ficou suspensa durante os 19 anos de tramitação da disputa de fronteira no STF.
Decisão
Ao analisar o acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso que atestou que o mandado de reintegração de posse originário foi efetivamente cumprido e certificado mediante a lavratura dos autos, a Turma entendeu que a prestação jurisdicional requerida nos idos de 1979 já foi entregue e cumprida, estando, portanto, exaurida.
Segundo o relator, a análise do STJ é restrita às questões de direito, sendo, por isso, mantidas as premissas fáticas adotadas pela origem: "não há como encampar o entendimento de que a pretensão da recorrente visa revigorar um mandado ainda não integralmente cumprido", ressaltou em seu voto.
Fernando Gonçalves também afastou a suposta prática de litigância de má-fé durante a longa tramitação do processo. Segundo o ministro, todos os litigantes detinham títulos de domínio hábeis a justificar suas posses e, confiantes nesses documentos, foram procurar amparo na Justiça, sendo que um recebeu proteção da Justiça mato-grossense e o outro foi amparado pela Justiça goiana.
"Do tumulto decorrente desta situação, o que sobressai é a impossibilidade de se considerar comportamento desleal a qualquer das partes, pois apenas buscam preservar direitos de que entendem investidos", concluiu o ministro.
O conflito na fronteira foi oficialmente encerrado em 2003, quando os governadores Marconi Perillo, de Goiás, e Blairo Maggi, do Mato Grosso, assinaram um documento definitivo pondo fim ao litígio fundiário entre particulares na divisa dos dois Estados, envolvendo os municípios de Alto Araguaia (MT) e Mineiros (GO).