Autor: Lázaro Alves Martins Júnior, é ex-bancário, ex-advogado, ex-Procurador Federal e atualmente é Juiz de Direito da Comarca de Ceres, Especialista em Direito Público e Mestre em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento, ambas titulações obtidas junto a PUC Goiás.
"Existem maus juízes. Assim como maus promotores de justiça e advogados. Na tessitura que forma o sistema jurídico de nosso país sob o aspecto material não existem assertivas absolutas de superioridade de um sobre o outro. Existem advogados mais preparados que juízes e promotores e o contrário é comum pelo contingente de cada uma das classes e pelo caminho necessário para galgar as respectivas carreiras sem que isso represente preponderância de uma classe sobre outra.
Nesse contexto cabe analisar os verdadeiros débitos dos operadores do direito para com a sociedade. O Judiciário os tem? Sim. O Ministério Público também, assim como os advogados, a imprensa irresponsável e os oportunistas de plantão e em campanha.
Quem já ouviu um advogado se desculpar perante seu cliente confessando ter errado processualmente e perdido a causa? Isso é raro, embora existam profissionais deste quilate. E este fato, o erro do causídico, acontece milhares de vezes todos os dias pelo Brasil nas mais diversas instâncias. De outro norte quem não ouviu advogados dizendo que o juiz não soube julgar, que o juiz é corrupto, que vai recorrer etc? Essa é a alternativa que se apresenta em contraposição a confissão do erro para muitos representantes das partes.
Também é comum ouvirmos que o Judiciário ou o juiz absolveu o criminoso. Nunca, nunca, se ouve que o Ministério Público não produziu provas para a condenação do bandido. É como se o Judiciário tivesse que ser o acusador e julgador.
Em suma, tudo deságua no Judiciário. Os erros dos demais operadores do direito passam ao largo da percepção popular e são impingidos, em grande parte injustamente, ao Judiciário.
Juízes erram? Sim, bastante, mas os erros podem ser corrigidos e só não o são quando os operadores do direito que postulam não utilizam os instrumentos processuais da forma correta.
Juizes ganham muito? Em verdade têm um salário razoável, corroído e inferior aos dos membros do Ministério Público, dos titulares de cargos em diversas carreiras de advogados públicos que atuam para o Estado e concomitantemente de forma privada, de várias carreiras públicas tais como auditores fiscais, assessores no Congresso, assessores em Tribunais Superiores, médicos, qualquer médio empresário de relativo sucesso etc., mas, somente o subsídio dos juízes é atacado, diuturnamente, por todos, passando imperceptível aos formadores de opinião que carreiras com grau de responsabilidade muito inferior ganham muito mais e exigem muito menos dos titulares dos respectivos cargos.
Tragam ao seu dia a dia para efeitos de comparação a realidade de primeira instância dos magistrados em Goiás e em outros Estados da federação: lidar diuturnamente com advogados, promotores, políticos, instituições públicas, servidores, criminosos perigosos, relatórios e mais relatórios às Corregedorias e CNJ, alimentação de sistemas (função tipicamente burocrática), processos urgentes e pedidos urgentes, reclamações e pedidos de Cadeias Públicas (atividade do Executivo simplesmente omitida por aquele Poder há décadas), audiências, tudo isso sob pena de responsabilização pessoal e ainda da forma “olho no olho”. Dizendo o “não” e enfrentando todas as consequências fáticas por isso. Some a isso ser compelido a acumular varas e comarcas e suas naturais responsabilidades acima expostas, responder por Turmas Julgadoras, assumir Diretoria de Foro, fazer deslocamentos, tudo isso sem contrapartida financeira, colocando-se em franca situação de quebra de isonomia com colegas que não exercem as mesmas atividades e percebem o mesmo subsídio.
Todos querem ter acesso e direito de falar diretamente com juízes, a qualquer hora e dia para resolver todos seus problemas, como se sempre estivessem com o direito ao seu lado o que muitas vezes não é verdadeiro. Em outra ponta, ninguém, absolutamente ninguém, consegue falar com o chefe de uma repartição pública qualquer. Pior, em algumas existem senhas. Se elas acabaram, acabou-se a possibilidade de atendimento. E mesmo assim na opinião de alguns obtusos ou mau intencionados o Judiciário é o mais fechado, inacessível e antidemocrático dos poderes, embora com menos privilégios e direitos que muitas carreiras burocráticas, despiciendas e usurpadoras dos recursos públicos.
Tornou-se comum imputar todos os males do mundo a magistratura, talvez por ter arrefecido o ânimo de reclamar dos representantes do legislativo ou do executivo, uma vez que as coisas permanecem como estão e a função de provocar o Judiciário para que isso não se perpetue é do Ministério Público, que coincidentemente e de forma deletéria para a própria autonomia daquela augusta e necessária instituição tem seu chefe escolhido em todas as instâncias pelo chefe do executivo, ou ainda por outros entes públicos e pela sociedade civil organizada, inclusive, a OAB. Vejam a situação nacional dos estabelecimentos carcerários, de internação de menores e de saúde. O Judiciário não pode iniciar os processos, mas, é o culpado, segundo o que se passa a população pelas omissões de todos os demais personagens.
Causa certo estupor ver que o Conselho Nacional de Justiça exigiu a exposição de todos os processos administrativos disciplinares tramitando em face de juizes estaduais de forma imediata, inclusive de forma oblíqua os identificando e expondo. Os magistrados do trabalho e federais de forma letárgica o fazem. Por certo não cometem e nem são acusados de irregularidades, embora os casos mais agudos e divulgados nos últimos anos envolvendo malversação de dinheiro público e venda de sentenças tenham vindo destes segmentos do Judiciário.
É mais estranho ainda que o Conselho Nacional do Ministério Público não siga o mesmo exemplo e ninguém, absolutamente ninguém, reclame.
Seria interessante também que a Ordem dos Advogados do Brasil divulgasse os processos disciplinares que conduzem internamente seguindo a propalada, positivada e necessária igualdade entre os personagens processuais. Melhor, seria extremamente benéfico que fosse criado o Conselho Nacional da Advocacia, composto por advogados, promotores e magistrados para resguardar os direitos eventualmente feridos dos jurisdicionados que ali poderiam reclamar.
Mas, como a própria magistratura não reage a altura, acredito que todos que a criticam estão certos. Acabemos com a magistratura. Instalemos, como vem sendo feito pouco a pouco e se vê vicejando com enorme vigor a ditadura “branca” onde o executivo controla todas as verbas, loteia cargos, comanda o país e os estados sem dar atenção a ninguém e a nenhum outro Poder. Transformemos os juízes em servidores públicos de terceiro escalão, acabemos com seus subsídios, prerrogativas e garantias. No futuro será interessante observar a forma de resolução dos processos diante de um Judiciário alquebrado, fraco, onde os “poderosos” mandarão de forma absoluta, o que todos sabem, não ocorre em primeira e segunda instância. Adeus democracia!
O povo não tem apenas os políticos que merece, têm, também, o Judiciário que merece, e que caminha pelas forças políticas espúrias que o empurram para se equivaler em gerações futuras ao atual legislativo e executivo que aí estão espraiados nacionalmente.Parabéns cidadãos incautos, e boa sorte! Vão precisar se não passarem a entender a estrutura estatal e os verdadeiros responsáveis pelas mazelas que sofrem".