Foto: Hernany César/TJGOJuiz de Direito na comarca de Serranópolis (GO), Fernando Rezende discorre, neste artigo, sobre os princípios que sedimentam a atualização recente do Código de Processo Civil (CPC), com destaque para a proibição da surpresa, mencionada nos artigos 9º e 10º daquela legislação.Leia a íntegra do artigo.Fonte: Assessoria de Comunicação da ASMEGO
Foto: Hernany CésarJuiz de Direito da Vara da Auditoria Militar, Gustavo Assis Garcia discorre, em artigo, sobre a proposta idealizada pelo Conselho Nacional de Justiça denominada Audiência de Custódia.Leia a íntegra do artigo.Fonte: Assessoria de Comunicação da ASMEGO
Placidina Pires, juíza da 10ª Vara Criminal da comarca de Goiânia, assina artigo em que analisa o projeto denominado Audiência de Custódia. Confira os argumentos da magistrada sobre essa proposta.Leia a íntegra do artigo.Fonte: Assessoria de Comunicação da ASMEGO
Confira artigo assinado pelo juiz Eduardo Alvares de Oliveira, do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), pós-graduado em Ciências Criminais pela Uniderp, acerca do projeto do Conselho Nacional de Justiça denominado Audiência de Custódia. Eduardo Alvares atua na comarca de Rio Verde.Leia a íntegra do artigo.Fonte: Assessoria de Comunicação da ASMEGO
O juiz Ricardo Luiz Nicoli, de Rio Verde (GO), assina artigo com tema O acesso à justiça e os Juizados Especiais, no qual discute direitos e garantias dos cidadãos aos mecanismos e procedimentos relacionados à justiça. No texto, o magistrado discorre sobre influências políticas, filosóficas, religiosas, sociológicas, econômicas e jurídicas no acesso da população à justiça.Leia a íntegra do artigo.Fonte: Assessoria de Comunicação da ASMEGO
O juiz Fernando Augusto Chacha de Rezende, de Serranópolis (GO), assina artigo intitulado Inconstitucionalidade Material do Parágrafo 2º do Artigo 1584 do Código Civil - Guarda Compartilhada Impositiva no Dissenso - Princípios Constitucionais Vetores da Dignidade da Pessoa Humana, Melhor Interesse da Criança e Afetividade. No texto, o magistrado aborda, entre outos aspectos, estes três princípios do Direito Constitucional inerentes à guarda.Leia a íntegra do artigo.Assessoria de Comunicação da ASMEGO
Artigo produzido pelo juiz Eduardo Alvares de Oliveira, da comarca de Uruana, discute os Direitos Fundamentais de Segunda Dimensão no Estado Constitucional Democrático e a Jurisdição Constitucional. No texto, o magistrado, embora conclua que os direitos sociais são direitos subjetivos, e portanto exigíveis e com aplicabilidade direta e imediata, afirma, também, "não desprezar as opiniões daqueles que sustentam a dificuldade de concretização dos direitos sociais e a existência de restrições fáticas e jurídicas dos direitos fundamentais". Ao trazer análise de julgados do Supremo Tribunal Federal sobre o tema, o juiz aborda também, entre outros aspectos, "a existência de uma força normativa da Constituição e o papel da nova hermenêutica na concretização dos direitos fundamentais." O magistrado é juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás e pós-graduado em Ciências Criminais.Leia a íntegra do artigo.Fonte: Assessoria de Comunicação da ASMEGO
O juiz Joseli Luiz Silva, da 3ª Vara Cível da Comarca de Goiânia, assina monografia defendida junto à Universidade Federal de Goiás e Escola Superior da Magistratura do Estado de Goiás em que analisa o aspecto da dispensabilidade do advogado para o pleno exercício do direito de ingresso em juízo e acesso à jurisdição. Leia a íntegra da monografia aqui.
Diálogo, integração e poder democráticoJeronymo Pedro Villas BoasA sociedade forma, na sua interação, aquilo que Carl Jung denominou de inconsciente coletivo, que amalgama nos seus arquetípicos não somente símbolos, mas também os sentimentos norteadores dessas formulações. A teorização do discípulo rejeitado de Freud, que forçou o pai da psicanálise moderna a reunir um grupo fechado de seguidores para insular suas teorias acerca do inconsciente, propõe uma explicação racional para o inconsciente coletivo.Como os acontecimentos e circunstâncias que nos cercam encontram-se embebidos em valores e sentimentos individuais, e em certos casos coletivos, mesmo em frustrações coletivas, como a ocorrida no Movimento das Diretas, tais fatos podem gerar fobias sociais e despertar conteúdos psicológicos. Na explicação de Erich Fromm, esses acontecimentos são sentimentos responsáveis por uma espécie de inconsciente social.Há cerca de três décadas, o Brasil viveu momento histórico da maior relevância, chamado de Movimento das Diretas, onde as forças sociais foram mobilizadas em grandes manifestações, gerando o desejo e a vontade manifesta de cada participante votar para presidente do Brasil, para colocar fim à ditadura, uma espécie de Ares mitológico. Nenhum brasileiro que viveu naquele momento pode negar esse sentimento pujante que surgiu e se intensificou no meio social, frustrado pela sujeição dos chamados “líderes das diretas” ao colégio eleitoral, que elegeu o presidente civil por meio indireto.Lutamos pela ruptura e fomos sujeitos a um processo de transição que visava apenas sublimar os desejos de mudança e transformação das relações sociais. Como resultado dessa frustração, a fobia do autoritarismo militar não foi vencida e essa força repressora passou a povoar o inconsciente de todos os brasileiros, tornando-se recorrente a ideia-pensamento de que a qualquer momento Ares poderia retornar ao poder, caso a sociedade democrática não se comportasse bem. Sentimento que se tornou causa de fobias e ansiedades, impedindo avanços na democratização.No caso do Poder Judiciário, esse sentimento de repressão apareceu ainda mais latente, diante de sua atividade central de distribuir justiça e do modo como o Poder se organiza internamente, com fortes mecanismos punitivos (Espartanos). A fobia que se acentuou no Judiciário tem, portanto, uma causa repressiva e inconsciente que torna a relação do juiz com seu tribunal uma típica relação edipiana. Adiante, toco nessa fobia, que tem origem no medo da democracia, com sua recorrência a possível volta do autoritarismo. Depois, falo do diálogo como único meio de tratá-la, objetivando integrar e democratizar o Poder Judiciário.A fobia, como se sabe, é uma aversão exagerada a certos objetos, situações, animais ou ideias. Sentimento que pode se expressar no medo de ser exposto socialmente e que geralmente é tratada expondo o fóbico, em situações controladas ao objeto de sua fobia. Entretanto, o conhecimento sobre o objeto da fobia e a busca do entendimento dos conteúdos simbólicos que envolvem o medo podem ajudar a dissipá-lo. Como o medo da democracia no Judiciário é recorrente ao medo de punição seletiva, somente o entendimento de que o avanço da democracia diminui os espaços punitivos (nas suas diversas formas, inclusive de segregação ou apartheid) pode aliviar esses sintomas coletivos.No comportamento democrático, o sujeito da ação se encontra vulnerável e mais exposto a falhas, sendo natural que esse complexo enseje maior insegurança e medo de punição, o que remete a um conflito entre duas forças internas, chamadas por Freud de Eros e Tanatus. Esse sentimento, ensejando justamente o medo imaginário de Ares, com o retorno de um sistema autoritário que pune violentamente, sujeita a ação livre ao comportamento convencional e de aceitação do status quo. O Judiciário, portanto, vive esse momento (situação) de estresse, que consome seus mecanismos de defesa e o torna vulnerável justamente por não possuir internamente espaços democráticos de diálogo que esclareça e elimine e medo.E o interessante é que a cura dessa fobia ou neurose somente é possível pelo diálogo, para que através de transferências e assimilações cada agente possa compreender melhor o meio social em que se encontra inserido – pois no dizer do evangelista: “não somos do mundo, mas estamos no mundo”. Embora minha linguagem nesse texto seja marcadamente psicológica, não proponho aqui terapias de grupo ou soluções milagrosas de cura, mas apenas a ideia central de que democracia se inicia com diálogo e aprendizagem. O diálogo na sua forma de múltiplos esclarecimentos pode tratar a fobia e liberar o agente do medo da democracia inserindo na sua dinâmica justamente a liberdade – porém, não no sentido de “ser livre” mas de “estar se libertando”.O Fórum Permanente de Democratização do Poder Judiciário surge com essa perspectiva central de integrar os participantes através da ideia de que democracia é diálogo aberto e livre manifestação do pensamento, força capaz de transformar o poder em instrumento democrático.
Sociedade comercial e conjugalSirlei Martins da CostaComum o equívoco no sentido de que, havendo divórcio, o cônjuge se tornará sócio da empresa do ex-marido (ou mulher). Contudo, no Direito Brasileiro não é assim que acontece. Para que isso seja melhor entendido, necessários alguns esclarecimentos acerca da natureza jurídica das sociedades empresariais, as quais são organizações econômicas dotadas de personalidade jurídica e patrimônio próprio, constituídas, de ordinário, por mais de uma pessoa física ou mesmo jurídica.Ensina Rof Madaleno que “a finalidade prática da personificação da sociedade é a de estabelecer a separação do patrimônio dos sócios em relação ao seu patrimônio, porque, não obstante os sócios ingressem na sociedade, de regra com o aporte de bens ou recursos financeiros pessoais, transferem para ela este patrimônio que passa para a sua titularidade.”1A empresa e seu patrimônio não podem se confundir com a pessoa física de seus sócios e nem com o patrimônio particular destes. Corolário disso é que, constituída a empresa, os cônjuges dos sócios não serão beneficiados com o sucesso financeiro da sociedade comercial e nem terão que arcar, com seu patrimônio pessoal, no caso de fracasso econômico da sociedade jurídica.Tampouco se admite a partilha do acréscimo do patrimônio da empresa, possivelmente havido na vigência do casamento. É que a pessoa jurídica não é um bem em si. É, em verdade, uma entidade, que pode crescer ou quebrar. Conforme a legislação brasileira, no caso das sociedades limitadas, na hipótese de insucesso da empresa, os bens dos sócios somente a socorrerão se comprovada má-fé ou o equivalente em relação ao sócio. Isso se dá em razão do princípio da autonomia patrimonial. Neste sentido já decidiu o Egrégio Superior Tribunal que a valorização patrimonial das costas sociais de sociedade limitada, adquiridas antes do início do período da convivência, decorrente de mero fenômeno econômico, e não do esforço comum dos companheiros, não se comunica [1].[2]O que pode ser considerado bem do sócio e, portanto, portanto partilhável, são as cotas da empresa. Assim, ainda que a sociedade tenha sido constituída antes do casamento, as cotas adquiridas pelos sócios no curso do casamento devem sim ser partilhadas com seus cônjuges no momento do divórcio, consoante apregoam os artigos 1.660, inciso I, 1.667 e 1.672, todos do CC; bem como a súmula n. 337 do STF.Havendo partilha de cotas por força de divórcio ou declaração do fim da união estável, o pagamento a ser feito pelo cônjuge cotista deverá obedecer ao que dispõe o artigo 1.027 do CC: “Os herdeiros do cônjuge de sócio, ou o cônjuge do que se separou judicialmente, não podem exigir a parte que lhes couber na cota social, mas concorrer à divisão periódica dos lucros, até que se liquide a sociedade”A regra acima citada tem a finalidade de preservar a pessoa jurídica das vicissitudes próprias das pessoas físicas, dentre elas o divórcio e a morte de seus sócios. A conclusão que se chega é que o cônjuge divorciado do sócio não se torna sócio e não tem direito ao patrimônio da pessoa jurídica. Tem direito sim - com exceção do regime de separação convencional e total de bens - à metade das cotas adquiridas na constância do casamento. No que tange ao quantum devido pelo sócio em razão do direito do ex-cônjuge, necessário que se apure o valor das cotas por ocasião do pagamento, em procedimento próprio e diverso daquele que extinguiu o vínculo matrimonial. Aí sim, o sucesso da empresa refletirá no interesse particular do ex-cônjuge divorciado, pois quanto mais estável e bem-sucedida a empresa, maior será o valor de suas cotas.Sirlei Martins da Costa – Juíza da 1ª Vara de Familia e Sucessões (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.)[1] Madaleno, Rolf – A desconsideração judicial da pessoa jurídica e da interposta pessoa física no direito de família e no direito das sucessões, 1ª ed. Rio de Janeiro; Forense, 2009, p. 14[2] REsp nº 1.173.931 – RS. Terceira Turma. Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino. DJ 28.10.2013
Juiz Gilmar Luiz CoelhoGilmar Luiz CoelhoJuiz de Direito e presidente da Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (ASMEGO)O dia 31 de março de 2014 rememora a triste lembrança da supressão das liberdades democráticas do povo brasileiro ao marcar os 50 anos do golpe militar de 1964. Em contraste com a data, o movimento nacional encabeçado pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), encampado integralmente, aqui, pela Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (Asmego), tem como objetivo precípuo a democratização e aprimoramento do Poder Judiciário no Brasil. Neste dia, em plena sintonia com a AMB, a Asmego e as entidades associativas nos demais Estados mobilizam-se em torno da aprovação de mudanças nos regimentos internos dos tribunais brasileiros, permitindo, assim, a participação de juízes de primeiro grau na escolha de seus presidentes e vices. No modelo atual, apenas desembargadores têm direito a voto no processo de eleição destes gestores.Em Goiás, a Asmego reúne os magistrados em ato que será realizado às 9 horas de amanhã, no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, quando a entidade protocolizará requerimento pleiteando e defendendo a alteração do seu Regimento Interno no sentido de permitir a participação dos juízes de primeiro grau no processo de escolha do presidente e vice-presidente do órgão estadual. Trata-se de um movimento nacional, por meio do qual as 27 associações estaduais, as associações de juízes federais e de juízes trabalhistas, com a co-participação da AMB, farão idêntico pedido na mesma data.No modelo atualmente em vigor, o único requisito exigido para se eleger o presidente e o vice-presidente dos tribunais é o da antiguidade no cargo. Isso faz que somente 17% dos magistrados votem, em detrimento de 83% da magistratura do País, composta de juízes do primeiro grau, alijados do processo de escolha dos dirigentes do Judiciário.Como excluir dessa decisão aqueles que representam, na prática, a porta de entrada do Poder Judiciário brasileiro? Hoje, 90% dos mais de 120 milhões de ações em tramitação no Judiciário estão no primeiro grau. Sob a presidência dos juízes das varas cíveis, que contam com, no máximo, três assistentes, há, em média, 10 mil processos. Já, no segundo grau, com bem menos processos em tramitação, há 12 ou mais assistentes para cada desembargador. Somente com eleições diretas poderá o gestor investir de forma adequada no primeiro grau, dotando-o da infraestrutura necessária ao seu bom funcionamento, objetivando a rápida prestação jurisdicional.Nesse novo formato de eleição, o candidato a presidente haverá de discutir ideias e projetos para todo o Judiciário, permitindo decisões democráticas quanto ao uso do orçamento deste poder. Com eleições diretas para presidentes e vice-presidentes dos tribunais brasileiros ganha a Justiça e ganha toda a sociedade que a ela recorre.
O magistrado analisa, no texto, os argumentos contrários ao movimento de democratização do JudiciárioA seção de Opinião do jornal O Popular de sábado (5) publicou artigo do juiz de Direito goiano Jeronymo Pedro Villas Boas sobre a mobilização de magistrados em todo o Brasil por eleições diretas nos tribunais. No texto, o juiz defende a participação de toda a classe de magistrados na escolha dos presidentes e vice-presidentes dos tribunais brasileiros e faz uma análise dos argumentos contrários à democratização do Judiciário.Leia a íntegra do artigo.Um poder sem democraciaJeronymo Pedro Villas BoasJuiz de DireitoConta-se na anedota que dois velhotes foram juntos ao mercado, combinaram comprar bacalhau, batatas, cebola, sal e azeite. Lá chegando um diz aooutro: - Enquanto você busca o arroz, o óleo e o sal eu pego a galinha para o preparo da galinhada, como combinamos. O outro responde: - Certo! Foi exatamente isso que combinamos...Não, errado! Não foi isso que combinamos em 1988, quando saímos às compras no mercado das ideias constituintes, acerca da democracia. Na lista constitucional o artigo 96º expressou em linhas fortes o seguinte compromisso:Art. 96. Compete privativamente:I – Aos tribunais:a) Eleger seus órgãos diretivos...Como agora não realizar eleições amplas e democráticas para os órgãos diretivos dos tribunais?Uma resposta negativa a essa questão somente pode ser creditada a interpretação restritiva de que "compete apenas aos tribunais eleger seus órgãos de direção" isolando o dispositivo constitucional do restante da Constituição; aliás, o decapitando do espírito de seu tempo, para identificar apenas os integrantes do segundo grau de jurisdição [desembargadores] como capazes de exercitar o sufrágio (ADI 2012/STF), por integrarem o órgão colegiado. Como pano de fundo dessa interpretação restritiva se encontram três razões solipsistas, são elas: 1) A democracia suscita divisões internas; 2) A democracia politiza o Judiciário; e, 3) a democracia não é boa para o Judiciário.1) A democracia suscita divisões internas. No aspecto de sua compreensão global essa assertiva se expressa como uma verdade insofismável, pois onde há democracia existe divisões, opiniões contrárias, reversão da opinião e, sobretudo deve existir tolerância, por conta disso a liberdade de expressão é tão importante para a democracia. Contudo, numa visão minimalista essa aparente verdade perde conteúdo, pois a democracia se "totaliza" nessas divisões internas, eis que sem conflitos de opiniões não há democracia. A democracia é produto de divisões e não as divisões produto da democracia. E, somente por não haver consensos é que ela existe e se fortalece.2) A democracia politiza o Judiciário. A primeira vista a democracia politiza tudo, nesse regime não há espaço para a antidemocracia, pois a despolitização que resulta do medo, em regimes de exceção é uma das antíteses da democracia. A questão é entender o termo "politizar" não no sentido puramente aristotélico de engajamento político [zoo politikon], mas a partir do tomismo como socializar ou integrar, de onde surgem as concepções de cidadania passiva e ativa que vão resultar no princípio da integração, como uma constante da existência do Estado. Sem socialização qualquer estrutura humana se desintegra e com o Judiciário não é diferente, o poder necessita dessa relação interna socializante e integradora para que se mantenha lúcido.3) A democracia não é boa para o Judiciário. Há nesse argumento um paradoxo [leia-se: o Judiciário não é democrático!] somente compreensível com a constatação de o Judiciário funcionar como o superego da sociedade diante da sua compulsão de controlar comportamentos sem ser controlado. Supercontrole o que decorre de um ego mal formado. Ora, se os membros não alimentarem os seus órgãos internos certamente tudo andará mal para o corpo, como na fábula de Agripa.Pois bem, democracia não é somente o exercício do sufrágio, mas um diálogo que se qualifica com a intersubjetividade e que se faz dialógico, como na expressão buberiana, em relação de múltiplos esclarecimentos. Se esse diálogo não for uma expressão constante no Judiciário, certamente os ingredientes das suas listas serão a toda ordem trocados, no momento das compras, por contingências, impressões ou escleroses – empiricamente falando.A assertiva: "compete privativamente aos tribunais" deve ser lida com os óculos do princípio democrático, estabelecido pela Constituição de 1988 (art. 1º). E, portanto, com a constatação de que a Constituição fortalece o Judiciário ao incluir na expressão jurídica "tribunal" tanto juízes de primeiro como os de segundo grau, ou seja, toda a magistratura ativa, de forma democrática.Fonte: Assessoria de Comunicação da ASMEGO (com informações do jornal O Popular de 05/04/2014)
Gilmar Luiz Coelho é juiz de Direito e presidente da Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (ASMEGO)Hoje e amanhã, Goiânia sedia o 12º Congresso Goiano da Magistratura, evento promovido pela Associação dos Magistrados do Estado de Goiás e Escola Superior da Magistratura de Goiás. Nestes dois dias, alguns dos mais renomados juristas brasileiros desembarcarão na capital goiana para o debate de temas que interessam, entretanto, não apenas aos operadores do Direito, mas a toda a sociedade. Tanto que em 2013 o congresso teve recorde de inscrições, com número de inscrições surpreendente de juízes, advogados, promotores, estudantes e comunidade em geral. Com o tema “A magistratura e o combate à corrupção e impunidade nos 25 anos da Constituição Federal de 1988”, as discussões travadas neste encontro lançarão luz, não tenho dúvida, sobre aspectos fundamentais relacionados à temática.A atualidade desse debate é indiscutível. Recentemente, vimos o Brasil ser sacudido, de Norte a Sul, em manifestações promovidas por milhares de filhos desse País que invocavam, entre outras coisas, o respeito no trato com a coisa pública. Tomadas por gente de todas as idades, as ruas das cidades brasileiras se transformaram num ambiente democrático para esta convulsão popular que gritou por decência, obediência à Constituição e dignidade.E é no Judiciário, na maioria das vezes, que a população deposita suas esperanças de que seus direitos serão garantidos e de que maus brasileiros, os cidadãos corruptos terão como resposta a força da lei. A magistratura tem, sim, papel fundamental no combate à corrupção e na proteção dos direitos do homem devidamente traçados na Constituição de 88. Mas trata-se, ressalta-se, de uma responsabilidade compartilhada com todos os demais habitantes dessa nação.Não se trata, a corrupção, somente, de um problema de controle das autoridades. Trata-se, a corrupção, de um mal presente nas mais diversas camadas da sociedade e extremamente nocivo às relações humanas e ao patrimônio público. Seus reflexos e efeitos são devastadores, sobretudo na vida dos cidadãos mais fragilizados economicamente, onde as consequências de atos de improbidade são mais severas. Ao considerarmos o combate à corrupção um compromisso de todos, abrimos incontáveis outros canais de controle social desse mal.O Judiciário tem feito sua parte, a despeito de toda a falta de estrutura de que padece. Ao estabelecer a Meta 18 para os Tribunais de todo o País, o Conselho Nacional de Justiça priorizou o julgamento de ações de improbidade administrativa e de crimes contra a administração pública. Segundo a meta, pretende-se julgar, até o final de 2013, todas as ações desta natureza que ingressaram na Justiça até 2011. E o Estado de Goiás, mesmo com mais de 90 unidades judiciárias desprovidas de juiz, tem se destacado entre os estados com o maior número de sentenças nesses casos.Cabe à população, portanto, posicionar-se como um agente em defesa de um patrimônio que é de todos nós. Cabe aos poderes constituídos e os organismos de defesa dos direitos do cidadão se fortalecerem com infraestrutura e recursos suficientes para uma eficiente, célere e satisfatória resposta aos desmandos com a coisa pública.Nas discussões que serão realizadas hoje e amanhã em Goiânia, a Associação dos Magistrados do Estado de Goiás contribuirá para o aprofundamento desse debate e o preparo dos operadores do Direito em Goiás no enfrentamento de um problema que atinge em cheio a dignidade de todos os brasileiros.
André Reis Lacerda é Juiz da Infância e Juventude e Diretor do Foro de Goianésia, diretor de Comunicação da ASMEGO e mestrando em Direito Constitucional pela Universidade de Lisboa, PortugalO papel dos pais perante o Estatuto da Criança e do AdolescenteA norma basilar que regula a proteção das crianças e adolescentes em nosso país está estampada no art. 227 da Constituição Federal Brasileira de 1988 que estipula que: “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança , ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. Por sua vez, regulamentando mais pormenorizadamente a questão, o artigo 22, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é claro ao referir sobre os deveres dos pais: “Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais”. Daí, à primeira vista, importante se considerar que, a despeito das obrigações do Estado, autoridades e sociedade como um todo, cabe aos pais a responsabilidade mais direta quanto aos filhos, até porque são destes dependentes.O que se tem visto hoje em muitos casos, infelizmente, é justamente o não atendimento destes preceitos legais. O que há, no mais das vezes, é uma nítida inversão de valores, na medida em que vários pais, ao 'colocarem os filhos no mundo”, pensam que devem atribuir suas responsabilidades para as creches, professores, conselheiros tutelares, autoridades constituídas incluindo-se até mesmo a polícia. Isto porque, não raro, mães acorrem até as delegacias ou varas da infância e juventude pedindo para que estas autoridades “dêem um jeito em seus filhos'.Por óbvio que o mundo de hoje não é o de antigamente em que filhos tinham um 'temor reverencial' aos pais e a rebeldia própria da adolescência não se confundia com filhos agredindo e até assassinando seus pais, como frequentemente tem noticiado a mídia. Entretanto, não se pode com isto simplesmente 'lavar-se” as mãos, atribuir a culpa de tudo para fatores fora da família e acharmos que uma solução mágica irá resolver todos os problemas inerentes à criação dos filhos da noite para o dia. A solução, como intuitivo, precisa passar primeiro pela conscientização geral e cada vez maior que cada pai deve ter pela criação de seus filhos e que esta tarefa não pode ser tida como delegável, cabendo aos pais um cuidado diuturno com cada ato, com a educação permanente, e com o planejamento do futuro que se quer para seus filhos. Assim, , pode-se perceber que é dever dos pais ou responsáveis legais educação de sua prole, sem se poder argumentar que crianças e adolescentes podem fazer tudo o que desejam sem respeitar a autoridade daqueles que exercem o poder familiar.A infração à lei pelas crianças e adolescentes, como é conhecimento quase geral, acarreta a incidência do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) que, protege e, ao mesmo tempo, aplica-lhes medidas sócio educativas e protetivas aos inimputáveis. Ou seja, não lhes são aplicadas penas conforme disposto no Código Penal, apesar de tanta gente achar que a única solução seria uma inconsequente redução da maioridade penal, a “depositar” cada vez mais seres humanos em cadeias de um Sistema Penal brasileiro que já deu vários indícios de sua falência. E, em plano diametralmente oposto, muitos sustentam a tese também simplista de que o que falta é educação – como se educação fosse uma pauta de política pública apenas cobrável de governantes, própria de manifestações populares nas ruas e greves por melhorias de salários de professores, sem que se apresentem ações concretas de melhoria de todo o sistema ou mesmo desconsiderando que educação começa na nossa casa, começa da relação dos filhos com os pais.Urge ressaltar que educar é bem mais amplo do que simplesmente sustentar, ultrapassa a esfera econômica atingindo questões psicológicas, sociais, afetivas implicando a formação integral do ser como uma pessoa crítica, participativa, política e valorizada em todas as suas potencialidades. Nesta temática, o doutrinador Valter Ishida melhor esclarece as responsabilidades dos pais e tutores, com relação ao artigo 22, do ECA:“Este artigo possui fundamental importância para a Justiça da Infância e da Juventude. A grande maioria dos casos em que chegam à vara menorista versa sobre conduta incompatível dos genitores biológicos. Isto em decorrência de descumprimento dos deveres supra elencados, básicos na criação de crianças e adolescentes”.O referido autor, referendando o importante papel a ser desempenhado pelos pais ou responsáveis pelas crianças e adolescentes, menciona que a incumbência pela educação de alguém é tão relevante para o contexto social, que o descumprimento do dever de educar deveria ser severamente punido a fim de evitar novas práticas delituosas, quer seja, a reincidência. Ou seja, atribui-se hoje que os adolescentes infratores são os causadores de grande risco social, sem, contudo, ir-se nas causas efetivas dos problemas que os acometem, desconsiderando-se não só a falta de políticas públicas significativas na área da infância e juventude, bem como a própria responsabilidade dos pais – que deveria ser muito mais cobrada.As pessoas em geral deveriam estar preparadas para constituir família, procurando montar primeiramente uma estrutura principalmente, para ter filhos, pois a relevância no contexto sócio econômico, político e psicológico é tal que o descumprimento da tarefa de educador acarreta um desequilíbrio jurídico social. Quanto mais crianças sem os cuidados diretos e responsáveis dos pais tivermos, maiores as chances de ocorrerem chacinas, crimes, miséria, dentre outros males.Alguns pais e/ou responsáveis ainda não estão cientes de que o poder familiar é um exercício de cidadania. É mais um dever que um poder. Esclarecendo melhor, argumenta-se que os genitores têm o encargo inerente à construção da democracia, pois o sucesso e/ou fracasso social de nossos pupilos depende das orientações recebidas, onde o bem e o mal são dois pólos que se repelem e se atraem concomitantemente, a depender em grande parte dos exemplos que estes jovens têm para seguir. Assim, não é incomum ver em uma Vara de Família que pais que tenham cerca de 04 (quatro) a 05 (cinco) filhos com várias mulheres diferentes, com baixa formação escolar e, consequentemente, com salários sempre próximos ao mínimo, acabam por não conseguir dar atenção necessária aos filhos. Quando muito, têm dificuldades de pagar as várias pensões alimentícias, pelo simples medo de irem presos. Daí, quando crianças como estas não dão sorte de ter mães diligentes e guerreiras o suficiente que consigam educá-las sozinhas, acabam por perder por completo qualquer referência familiar que, depois, é muito difícil serem “consertadas” por professore, autoridades ou mesmo pela aplicação pura e simples das “medidas socioeducativas' que, estas, pela falta de estrutura em nosso país, estão longe conseguir a ressocialização almejada. Portanto, não é demagógico tentar dar mais peso àqueles que têm a obrigação legal de educar impondo limites nas atitudes de seus dependentes e participando de suas vidas.Qualquer psicólogo diria que a criança possui a tendência de copiar padrões de condutas que lhes são mais próximos. Por este motivo, retrata as atitudes que vivencia e observa. Não é punida pelos seus atos, mas protegida, através de procedimentos que a põe a salvo da discriminação, dos maus tratos e da exploração. Geralmente, guardam o medo e a timidez que ecoam negativamente, de uma forma ou de outra, eis que reproduzem os padrões do lugar em que vivem e das pessoas que convivem. Uma criança que convive vendo seu pai agredir sua mãe, bebendo e violentando-a verbalmente e fisicamente, tende a crescer achando que isto é normal, quando sabemos que não.As crianças e adolescentes, como princípio mínimo de cidadania, devem ser respeitados e assim aprenderão a respeitar os outros. A questão da cidadania é bem mais ampla do que podemos imaginar, vai além da mera participação política: votar e ser votado. A criança e/ou adolescente têm de se sentirem capazes, produtivos, para se sentirem úteis aos anseios da sociedade, criando-lhes um sentimento de que podem fazer o bem, sem perguntar a quem.O “trabalho” de crianças e adolescentes, antes de tudo, porém, é estudar, frequentar as aulas e levar a sério a educação. Frisamos que a Lei 8069/90, em nenhum momento, mencionou o fato de que crianças/adolescentes não devam cumprir determinações, ou ferir os princípios de justiça, que acabam por lesar a sociedade em geral. Ao contrário, a lei evidencia o cumprimento do ordenamento jurídico vigente, o agir de forma lícita, a idoneidade, a virtude e não o caos, que é determinado pelo desrespeito, falta de valores éticos e morais tão presentes hoje em nossa sociedade.A valorização dos familiares das crianças e adolescentes, através do trabalho, estudo, salário digno para o sustento da prole, atendimento médico compatível com a natureza humana, levarão o jovem a ter o desejo de dar continuidade ao ambiente salutar em que vive (reprisa-se os modelos, quer sejam bons ou maus); no entanto, existem pessoas sobrevivendo sem qualquer dignidade.Quando o ECA, em seu artigo 1º, dispõe sobre a proteção integral aos indivíduos entre zero e 18 anos, não quis dizer que eles tudo podem fazer e que não devam ter limites. Isto é um grande equívoco de interpretação.Faz-se necessário, em primeiro lugar, tentar definir o que se quer dizer quando se pronuncia essa palavra: limites. Palavra esta, por vezes, revestida de muitas interpretações e equívocos. Partindo deste ponto de vista, pode-se destacar questões importantes, e dentre elas o fato de que limites e disciplina ajudam as pessoas a sentirem-se seguras, portanto, estes são necessários.Vale dizer que a idéia de poupar uma criança de crescer acaba condenando-a a ser eternamente criança, imatura e despreparada para o convívio e para o exercício da cidadania. Em outras palavras, quando pais não dão limites para seus filhos acabam limitando-os em sua condição infantil, o que impossibilita a passagem à maturidade. As regras são extremamente relevantes para que a criança entre no universo da razão. É importante salientar que, para que isto ocorra, são necessários muitos “nãos” com seus devidos “porquês”, bem como ser paciente e escutar com atenção, sempre lembrando que as atitudes e exemplos dos pais são as melhores lições e melhor forma de educação. Mais tarde, quando a criança for maior, ela respeitará quem lhe ensinou a viver adequadamente dentro das normas sociais.Dar limites aos filhos é demonstração de amor incondicional. A sociedade não tolera crianças e adolescentes desordeiros, cheios de mimos e sem regras. Os pais têm o dever moral de educar seus filhos e isto tem a ver com limite/amor; caso contrário, estará sujeito a ver seus filhos transgredindo a lei, respondendo a um processo em consequência de suas ações negativas.Mas, ao se deparar com crianças e adolescentes indisciplinados e infratores, se está diante de problemas que não são somente deles, mas, principalmente, de nós adultos, uma vez que cabe a nós - pais, educadores e sociedade em geral - a responsabilidade constante por sua educação, consoante se depreende da própria lei 8069/90.As crianças e adolescentes refletem a nossa alma, e eles reconhecem as nossas inseguranças e incertezas. Tem-se que ter a consciência de que somos responsáveis pelo seu equilíbrio, seus atos e estabilidade emocional e tudo isto passa pelo binômio limite/cuidado que é reproduzido socialmente, mas que começa em casa, começa na relação entre pais e filhos.
Nelson Lopes Figueiredo é presidente da Academia Goiana de Direito, advogado e autor dos livros Descaminhos do Poder e O Estado InfratorCondenar o Estado, absolver juízesEntre tantas reflexões produzidas no calor das manifestações de junho, pleiteando melhoras nos serviços públicos essenciais, o excelente artigo Corrupção se combate com a Justiça, do presidente da Associação dos Magistrados do Estado de Goiás, juiz Gilmar Luiz Coelho, publicado neste espaço (14/7), depois de noticiar algumas das vicissitudes que dificultam a luta contra a corrupção pela via judicial, conclui augurando que as crianças não tenham receio de escolher, entre outras carreiras públicas, a de juiz. Apesar da extrema oportunidade dos referidos comentários, pouco se tem falado, dentro ou fora das ruas, sobre um serviço público de fundamental importância na democracia cujas deficiências são gritantes e admitidas por autoridades públicas do mais alto escalão: o mau funcionamento do Judiciário. Como dolorosa consequência, a prestação da justiça que deveria ser rápida e barata, é cara, demorada e, portanto, ineficiente em nosso País.O jurista Raymundo Faoro (Os Donos do Poder), em histórica entrevista (IstoÉ, 4/7/2001), enfatizou com a autoridade de sempre esse aspecto da crise do Poder Judiciário afirmando: “O Judiciário precisa de uma reforma. Este é um país que não tem juízes. O juiz com dez mil causas não tem nenhuma. Já tive experiência disso. O juiz pertence a uma classe das mais sacrificadas. Em geral, chega na hora certa, sai depois do expediente e leva trabalho para casa.” Considerando que qualquer reforma do Judiciário, decorridos mais de dez anos, deverá priorizar a democratização da justiça, esse depoimento continua atual. No mesmo sentido, em declarações prestadas (6/7/2011) o ex-presidente do STF, ministro César Peluzzo, classificou o sistema judicial brasileiro como “perverso, ineficiente e danoso para 90% das pessoas que procuram o Judiciário (…) e que só verão sua causa ganha 10, 15, 20 e não raro 30 anos depois.” Embora existam outros aspectos que comprometam o bom funcionamento judicial, a sobrecarga dos julgadores de todos os níveis, do juiz ao ministro do STF, é sem dúvida o principal obstáculo à distribuição democrática, a custos módicos, de uma justiça célere.Contraditoriamente, reclamando muitos protestos e passeatas, o poder público é o principal protagonista do acúmulo de demandas que abarrota o Judiciário, sacrifica os juízes e emperra as engrenagens de sua estrutura. Embora a “explosão de litigiosidade” que aflige as diversas instâncias judiciais decorra, indiscutivelmente, da democratização, da inclusão social e do próprio aumento populacional, o Estado é o maior litigante entre todos que buscam solução judicial para os conflitos. De acordo com o relatório intitulado l00 maiores litigantes, divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em março de 2011, o setor público figura em 53,2% dos processos em tramitação, assim distribuídos: governo federal (14,4%), INSS (23,3%), Caixa Econômica Federal (8,5%), Banco do Brasil (4,2%) e os governos estadual e municipal (11%). E mais, é o maior entre os maiores recorrentes, sobrecarregando o Judiciário, principalmente nos tribunais superiores, com recursos sobre recursos, na sua maioria meramente protelatórios, visando tão somente evitar o fim do processo quando a decisão lhe é desfavorável.Superar esse entrave é o desafio imposto ao Estado contemporâneo por uma sociedade complexa, multiplicadora de conflitos e de demandas, vítima, em suas carências básicas, de injunções econômicas orquestradas globalmente e à distância, por forças invisíveis e poderosas. Também nesse aspecto de extrema relevância social a organização estatal, tal como se apresenta aparelhada e funcionando, ainda não conseguiu provar que não falhou. A conhecida máxima “o povo é o juiz dos juízes” pode ser convertida na seguinte sentença condenatória: o povo não absolve o Estado, por mais bons juízes que ele tenha.
Desembargador Nelson Missias de MoraisEx- Presidente da Amagis e ex-Secretário Geral da AMBVitaliciedade é garantia da própria cidadaniaOs movimentos sociais têm alcance importante para o revigoramento das instituições e do próprio estado de direito, pois são nesses momentos que se confirmam a força da democracia e da participação popular, para correção de rumos, quando algo está fora do eixo.Nas recentes manifestações, que se iniciaram em razão das majorações de passagens de ônibus em São Paulo, com reflexos em outras partes do Brasil, houve uma mobilização popular, convocada pelas redes sociais, com uma velocidade como nunca se viu.Foi um movimento espontâneo e sem liderança definida, que não foi conduzido a uma pauta mínima, que pudesse repor no eixo o que eventualmente estivesse fora e até mesmo para dar seqüência às reivindicações.De uma hora para outra o que se viu foi o Governo central produzindo uma agenda de ocasião, que passou a ser denominada de “positiva”, com trapalhadas de toda natureza, pois não conseguiu atingir o foco nem sensibilizar ninguém, chegando ao disparate de propor uma assembléia constituinte para tratar de um tema específico, ou seja, a reforma política, fulminada de inconstitucionalidade.O eco das ruas não estava nessa direção, embora relevante para a democracia e merecedora de uma discussão mais aprofundada e com seriedade, sem o ranço da resposta imediata para fenecer o incômodo que provoca uma mobilização popular.A partir daí o Congresso Nacional também passou a produzir a chamada “agenda positiva” legislativa.Não se pode olvidar que toda legislação casuística - para dar resposta imediatista a população - trás em si o perigo de atingir direitos caros à cidadania e a sociedade, conquistados por gerações, com prejuízo à liberdade e a própria vida de muitos. É lamentável, mas no apagar das luzes do semestre legislativo do Congresso Nacional o predicamento da vitaliciedade do magistrado brasileiro quase foi extinto.A sociedade não percebeu nem foi informada do alcance da medida, que seria um prejuízo irreparável para a cidadania.Juízes independentes, livres de pressão de poder político, econômico ou de qualquer outra natureza são necessários aos cidadãos na busca ou na reparação de um direito que lhe foi subtraído.As causas que aportam no Judiciário, muitas vezes por aqueles menos aquinhoados, como a do cidadão, já fragilizado, quando busca um medicamento não fornecido pelo governo ou um atendimento médico de emergência a ele negado, através da via judicial, precisa de resposta rápida e sem interferência dos poderosos.O magistrado livre das amarras do poder político, econômico ou de criminosos, onde o fraco e o forte se equivalem, foi uma conquista da cidadania e a ela se destina.O predicamento da vitaliciedade é a dimensão necessária do juiz independente, sem assombros na carreira, em razão das suas decisões.O que não está bem explicado é que o juiz pode perder o cargo sim, através de sentença condenatória com o trânsito em julgado.Seria um caos social e traria insegurança jurídica para a sociedade a possibilidade de o juiz, com base em decisões políticas ou por retaliação em razão do exercício da sua função judicante, ser demitido ou afastado.Os juízes, no exercício da sua função, têm peculiaridades que os diferenciam e impedem a perda do cargo por decisão administrativa. São agentes políticos, processam e julgam causas de interesses políticos, econômicos e criminosos vultosos.As PECs 53 e 505, a primeira no Senado Federal e, a segunda, na Câmara dos Deputados, relativizam a vitaliciedade do juiz brasileiro, facilitando sua remoção, afastamento das funções e demissão, por mera decisão administrativa, o que o torna vulnerável na sua independência para o enfrentamento das pressões a que está sujeito no exercício das funções.Esse é um grave prenúncio.Aliás, as garantias da magistratura, insculpidas na Constituição cidadã, art. 95, incisos I, II e III devem passar indenes do Poder Constituinte Derivado, por se encontrarem no âmbito das chamadas limitações materiais implícitas, com status de cláusula pétrea.No ordenamento jurídico pátrio existem normas que garantem a perda do cargo do juiz que o ocupa com indignidade, sem se resvalar, contudo, na garantia constitucional da vitaliciedade.Esse desvario legislativo para atingir garantias de independência do juiz brasileiro só pode ser creditado à necessidade de se desviar a atenção da sociedade que está focada em temas que exigem a mudança de comportamento de governantes e legisladores.A sociedade e a mídia têm um papel relevante na compreensão do alcance da garantia da vitaliciedade do juiz.A vitaliciedade do juiz é como a liberdade de imprensa para o jornalista e a inviolabilidade de opinião para o parlamentar. São cânones do estado de direito.Não se pode esquecer que quando a imprensa ou o parlamento são violentados, os juízes são os seus garantidores. É uma reverência a essa conquista da civilização. Nunca é demais lembrar que no período de restrição das liberdades democráticas a vitaliciedade foi suspensa, assim como a liberdade de imprensa e de opinião. Esse é um tripé intangível na proteção da democracia e da cidadania.As Associações de Juízes, que são o braço político da magistratura, têm proeminência na luta para a manutenção dessa garantia da sociedade e até aqui se fizeram ouvir.Nesse sentido a Associação dos Magistrados Mineiros, através do seu presidente, Herbert Carneiro, a quem tive o privilégio de acompanhar em Brasília, em contato com os parlamentares, contribuiu significativamente para evitar esse retrocesso.Acreditar que essa é uma defesa corporativista é a mais forte expressão da incompreensão dos valores que devem pautar o estado de direito.Desembargador Nelson Missias de MoraisEx- Presidente da Amagis e ex-Secretário Geral da AMB
Corrupção se combate com a justiça“Na primeira noite, eles se aproximam e roubam uma flor do nosso jardim: não dizemos nada. Na segunda, já não se escondem. Pisam as flores, matam o nosso cão e não dizemos nada. Até que um dia o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa rouba-nos a luz e, conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E já não podemos dizer nada”. (Bertolt Brecht, em No Caminho com Maiakovski)Muitas crianças acalentam o sonho de serem policiais, bombeiros, promotores e juízes, crendo que, ao crescerem, poderão combater as maldades, proteger os cidadãos e colaborar com a construção de um mundo melhor. Com o passar do tempo, o simbolismo “mocinho e bandido” por vezes vai se perdendo no imaginário infantil e muitos deixam este sonho ser contaminado pela impressão de que não adianta lutar contra o sistema e comodismo de achar que apenas quem escolheu determinadas carreiras é responsável por combater injustiças, criminalidade e corrupção.É neste sentido que os protestos atuais nos enchem de esperança, por demonstrarem a saída da inércia, literais gritos de basta a tudo o que demonstra estar errado, refletindo a vontade de participação popular nos destinos de nossa nação.O recado já foi dado. As reações no âmbito da política já podem ser sentidas, pelo menos com a redução ou não aumento do preço das tarifas de transportes públicos; anúncios de destinação específica de verbas públicas para saúde e educação (pelo menos na promessa); proposta de reforma política, mesmo que de afogadilho; e o cancelamento categórico da PEC 37. Já é um alento. Demonstra que as vozes estão ecoando e, por isto mesmo, a hora é de não nos calarmos, pois o silêncio e a omissão de pessoas que querem mudar este estado de coisas é que constituem o combustível necessário contra a corrupção e a impunidade e dão margem para que sejam perseguidos todos aqueles que ousam contrariar os interesses de poderosos, que se acham acima da lei.Parece óbvio que alterar a legislação em determinados pontos é necessário. Mas transformar, por si só, o crime de corrupção em hediondo, dentre outras medidas, de nada adianta se, de outra ponta, retirarem-se as garantias e independência daqueles que lutam diuturnamente e de forma inglória contra a corrupção em geral.Na prática, instrumentos de combate à corrupção existem e são os juízes que condenam traficantes, que condenam por improbidade administrativa e desvios de verbas e são juízes e demais operadores do sistema de Justiça que, ao tentarem fazer o seu trabalho com honra e coragem, acabam sendo ameaçados, perseguidos, ficando, muitas vezes, por sua conta e risco. Basta lembrar o caso da juíza carioca Patricia Acioli que, ao encarar o tráfico de drogas mais de frente, foi covardemente assassinada.Agora, surgem novamente em nosso cenário um pacote de PECs que tentam retirar a independência e autoridade do Poder Judiciário. A PEC 33, recentemente colocada em pauta, acabaria com a prerrogativa constitucional da última palavra do STF, que tem incomodado vários artífices de desmandos; as PECs 53 e 75, em conjugação com a PEC 505/10, foram trazidas à tona para tentar “demitir” administrativamente juízes e promotores, sem que sejam julgados por uma sentença transitada em julgado e ferindo as prerrogativas da vitaliciedade, que é uma das maiores conquistas em prol da independência do Poder Judiciário, para que juízes possam fazer valer todo este grito hoje manifestado nas ruas e continuem decidindo sem medo de serem retaliados ou perseguidos.Assim, a bem da democracia que ora se levanta, depois de toda a luta que ainda temos pela frente, esperamos que, ao perguntarmos para um criança o que ela quer ser quando crescer, possa responder sem medo: quero ser policial, bombeiro, promotor, juiz, nutrindo a esperança de que não pisem em nossos jardins e não roubem os nossos sonhos.Gilmar Luiz Coelho é juiz de Direito e presidente da Associação dos Magistrados do Estado de Goiás
João Ricardo dos Santos Costa, juiz de Direito em Porto Alegre e coordenador do Movimento Unidade e ValorizaçãoPECs 33 e 505: riscos de retrocessoA Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, em seu artigo 10, consagrou que “toda pessoa tem direito, em plena igualdade, ….” a um “Tribunal independente e imparcial”.As lições do nacional socialismo e o comportamento dos tribunais do Reich levaram à inclusão do dispositivo como um dos instrumentos de proteção universalmente reconhecidos na Carta das Nações Unidas.Inserida no restrito catálogo de garantias da Declaração Universal, a independência dos juízes consiste no principal instrumento de proteção contra a barbárie que já ultrajou a consciência da humanidade.Mal vencido meio século do Pacto Universal, verificamos que os riscos de retrocesso ainda existem e, mais grave, são reais. No Brasil, duas expressões claras do resquício fascista que ainda habita o nosso parlamento são as PECs 33 e 505/2010.A primeira propõe anular a função constitucional do Poder Judiciário como membro republicano de controle do poder político. A segunda pretende colocar por terra a vitaliciedade dos magistrados, possibilitando a demissão administrativa de juízes. Ambas em confronto com o preceito universal da independência judicial, incorporado na Constituição de 1988.As razões das propostas legislativas não escondem as intenções, bastando leitura rápida às respectivas justificações para percebermos que se tratam de verdadeira represália pela atuação moralizadora do Judiciário contra fichas sujas e imigrantes partidários.A PEC 505/210 está embalada no conceito equivocado de que a punição máxima para um magistrado é a aposentadoria compulsória quando, na verdade, a exoneração é prevista, exigindo, porém, decisão judicial transitada em julgado. Ocorre que o sistema recursal brasileiro, editado pelo próprio Congresso, dificulta a punição por seu excesso de procedimentos.A melhor solução para combater a impunidade em todos os níveis, seria aprovar a proposta de redução de recursos, medida já sugerida, aliás, pelo ex-presidente do STF, Min. Cezar Peluso. Os juízes brasileiros necessitam de instrumentos processuais eficazes, e não de mecanismos que violem a sua independência.A magistratura defende a perda do cargo daqueles que praticam atos de corrupção no exercício da atividade jurisdicional, porém isso não pode ocorrer na precariedade de um processo administrativo e sem o esgotamento do que chamamos de devido processo legal. Necessitamos sim, e a magistratura está cobrando do Congresso, uma legislação processual mais célere e efetiva.É grave e preocupante a facilidade com que se descartam as mais caras conquistas da sociedade, para implementarem-se modelos que privilegiam um projeto de poder, em detrimento de um projeto de nação.A quebra institucional do Judiciário pretendida pelas PEC 33 e 505 na verdade removerá a barreira que protege as mais amplas liberdades e a independência de outros agentes vitais à democracia, como o Ministério Público, a Advocacia e a Imprensa. Ruirão no mesmo ato, sem troca de cenário.(Artigo originalmente publicado no Blog do Frederico Vasconcelos / Folha e S. Paulo)